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Desculpem se me dirijo a vocês na minha língua mas sabem como é: os leitores estão primeiro. Sei que à hora em que eles me lerem já tomaram a vossa decisão e também não seriam estas minhas palavras que vos iriam fazer mudar de sentido, por isso esta minha carta aos britânicos é, acima de tudo, uma carta a nós próprios, que é o destino a que nos entregamos quando partilhamos com orgulho o título de cidadão europeu.
Eu bem sei que se vocês já se dirigiram para a saída de emergência da União Europeia, não é por isso que deixarão de pertencer a este belo continente, mas este referendo será sempre uma mancha a separar-nos. Porque eu estou como o vosso compatriota Ed Dorrel que, num bar no Qatar, mudou de eurocético para defender o "ficar". À volta dele estavam europeus mas especialmente gente com novos poderes globais chineses, indianos, árabes e russos. "Eles estavam a ouvir batidas africanas e pop sul-americano". E foi assim que ele percebeu que "no nosso futuro globalizado, o "soft power" britânico será o equivalente a atirar dardos com uma pistola de brincar a uma pantera".
Sim, quando falo desta nossa Europa, falo de história, de cultura e muito especialmente dos princípios básicos de que comungam as nossas sociedades democráticas, como os direitos humanos, o primado da lei, as liberdades cívicas, a liberdade de imprensa... Princípios que estão em regressão em algumas destas novas potências e pelos quais, num mundo globalizado, só teremos capacidade para lutar se permanecermos juntos, se tivermos escala.
Por isso, desejo ardentemente que não desertes. Tu que foste crucial para terminar com tantas ameaças totalitárias não podes deixar-te vencer pelo cansaço e pelo medo. Sim, eu sei que Bruxelas pode ser desesperante, com a sua opacidade e os seus burocratas e por isso tenho também a certeza de que estaremos mais desprotegidos se perdermos o vosso sentido crítico. Sim, eu sei que os tabloides estão fartos de instigar o medo aos emigrantes e o ódio à EU, mas é isso que os tabloides fazem para vender, atiçar os nossos instintos básicos. Mas quem encheu as margens do meu rio de nomes de família e fez do Vinho do Porto o sucesso planetário que é hoje sabe mais do que isto, não?
Desconfio, mas não consigo adivinhar qual seria o sentido de Churchill se ontem tivesse votado, mas acho que foi ele que disse, um dia, "o sucesso não é definitivo, o falhanço não é fatal: o que conta é a coragem de continuar". Continuem(os) europeus.
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