A discussão à volta da condição pública ou privada da Caixa Geral de Depósitos (CGD) não pode ser uma discussão ideológica. Tem, antes de mais, de ser uma discussão sobre a efetividade da nossa soberania nacional.
Corpo do artigo
Já não temos fronteiras fechadas, os nossos principais rios nascem em Espanha, a infraestrutura de produção e distribuição energética não é nossa e não temos moeda nem política monetária próprias. Também não mandamos na nossa produção agrícola e por isso não garantimos o que precisamos para comer.
Temo-nos a nós, à nossa paisagem e àquilo que produzimos. Ou seja, temos (algum) turismo e (alguma) atividade industrial. A parte boa do determinante é que temos franco potencial para crescer em ambas as frentes. O cenário é difícil: 89% das sociedades não financeiras registadas em Portugal no final de 2015 são microempresas. Só 6% do total exportam. O endividamento é esmagador, com 74% do passivo constituído por empréstimos e créditos comerciais. O crédito malparado cresceu de 7,2%, em 2011, para 16,7%, no final do 1.º semestre de 2016.
Nestas condições, a generalidade dos bancos a operar, sem condições para assumir mais risco, financiam cada vez menos. No final do 1.º semestre deste ano, o valor total de empréstimos concedidos foi apenas 75,4% do emprestado em 2011.
Ou seja, o nosso aparelho produtivo empresarial é frágil e não tem condições para se consolidar sem a ajuda de, pelo menos, um operador financeiro nacional estrategicamente vocacionado para esse efeito e que possa decidir, antes de tudo, na defesa dos nossos interesses.
A gestão do crédito malparado e da atenuação do perfil de risco, desde que assentes em critérios de viabilidade económica de médio e longo prazo, tecnicamente estudados e implementados, conjugados com uma política económica sustentada em estímulos objetivos e de fácil implementação à cooperação interempresarial, à qualificação da gestão e à diversificação, são urgências imprescindíveis para o crescimento da atividade produtiva, única porta de saída para a nossa sobrevivência coletiva.
Haverá quem goste de ver estes temas reduzidos à iniciativa privada. Mas pode alguém esquecer-se de que já não temos, pura e simplesmente, nenhum banco privado português com capacidade de decisão estritamente nacional?
Por isso, gerir o tema da Administração da Caixa como o temos visto é irresponsável. Usá-lo para beliscar a necessidade da sua manutenção como empresa pública é simplesmente suicida.
ANALISTA FINANCEIRA