"São 5h05, quinta-feira, 24 de fevereiro, em Kiev, na Ucrânia. A guerra começou". Assim se repetiu ontem, em várias línguas, a notícia do ataque da Rússia à Europa. A guerra mais dura faz-se no terreno, longe dos olhares públicos. Mas há outras ofensivas em curso. A diplomática e a da informação serão decisivas. E terão enorme visibilidade.
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"O dia mais negro", declararam reiteradamente os média à escala internacional. Talvez venham outros igualmente assim. Pesados. Nos jornais de referência norte-americanos, o ataque a Putin faz-se em artigos de opinião e pressente-se nos textos noticiosos. Fiquei particularmente presa a um relato publicado no site da CNN por Olesia Markovic, doutoranda na Universidade pública de Kiev e mulher de um consultor da International Finance Corporation. A chegada da guerra anunciou-se de madrugada por um telefonema da empresa e pelo som das explosões. A família acordava assim com aquilo que Olesia diz ser "um filme de terror sem botão desligar". Vendo pela televisão as longas filas de carros de gente que fugia da cidade, esta família decidiu ficar, embora acreditando pouco que estão ali seguros. As malas foram feitas à pressa, para a eventualidade de terem de correr para um abrigo antiaéreo. Olesia diz que é urgente criar uma rede de segurança para a Ucrânia, capaz de proteger o país das garras imperialistas de Putin. Não é fácil.
Por coincidência, ao almoço, sou atendida no restaurante por uma simpática jovem, de sotaque estrangeiro. Na breve conversa, pergunto-lhe qual é o país de origem. "Ucrânia, junto à fronteira com a Polónia". "É um dia difícil, mas talvez essa zona esteja a salvo... ", digo-lhe para a sossegar, porque subitamente o seu rosto se fechara e os olhos lacrimejavam. "Estou a seguir tudo desde as 5h. Há ataques por todo o lado e muita gente já morreu", diz. Este é o lado real da guerra. Que ataca pessoas concretas e desfaz vidas. Isso não se discute nos palcos diplomáticos, nem se mediatiza com exatidão. Temos de sentir. Em proximidade.
Daqui em diante, o Ocidente erguerá várias frentes de defesa. Nos Estados Unidos, Joe Biden vai tentar liderar um xadrez político que será disputado por vários líderes europeus, cada um por diferentes razões à procura de capitalizar dividendos internos. No entanto, a construção de uma opinião pública passará sempre pela informação jornalística. Que hoje apresenta novas configurações. Agora não basta apenas dominar as imagens que se dão a ver da guerra, é preciso também acompanhar o que se diz no universo digital. Nessas batalhas, os russos também não vão poupar armas...
*Prof. associada com agregação da UMinho