Ia a passar na rua, pejada de turistas brasileiros, e ouvi uma voz , entre o irónico e o ameaçador, que dizia "veremos como vai descascar o abacaxi..."!
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Aquilo soou-me a uma espécie de desabafo do nosso alter ego coletivo em vésperas de eleições dirigido a todos os protagonistas que por esta altura se empenham nas lides preparatórias.
Ainda que, se pensarmos bem, a nobre tarefa de descascar o fruto rei sem se ferir com as suas farpas está essencialmente nas mãos de António Costa.
Quatro anos depois, em plena fase de transição de uma crise mais do que aguda e em pleno rescaldo de uma experiência governativa de base parlamentar inédita e ferozmente votada ao fracasso por todos os opositores, António Costa consegue manter a prerrogativa de ditar as regras.
Que tipo de protagonismo vai exercer?
Com ou sem espaço para futuras lideranças?
Que tipo de campanha vai fazer?
A assumir os (eventuais) problemas estivais (dos incêndios às greves)?
Ou a conseguir passar pelos pingos da chuva?
Ou pelo meio dos autarcas?
Que tipo de governo vamos ter?
De base governamental ou parlamentar?
Ou será de parceria presidencial?
Com quem se coliga se não tiver maioria absoluta?
A que cedências obrigará os partidos à Esquerda?
A que espécie de ostracismo votará os à Direita?
Que negociações influenciará para conseguir a melhor pasta para o/a comissário/a portugues(a)?
Convenhamos que não são poucos os nós deste abacaxi sumarento.
E, mal descascado, é simplesmente uma sobremesa falhada.
E convenhamos também que o país se parece mesmo com um daqueles episódios de antiga comédia brasileira onde na sala que se esvazia fica o cómico de serviço, frente ao problema, a coçar a nuca e sem perceber como ficou sozinho "para descascar o abacaxi".
Para o bem do país e lamentando-se que pareça não ser possível assegurar, neste momento, quem melhor nos evite a embrulhada, espera-se que António Costa tenha a serenidade e a lucidez suficiente para nos garantir um pós-férias que, pelo menos, faça sentido.
* ANALISTA FINANCEIRA