Pensava que em 25 de Abril era obrigatório consagrar o dia a comemorar aquilo que ele nos deu, e não aquilo que, decerto involuntariamente, nos tirou. Afinal, o grande acto oficial consistiu numa cerimónia que reuniu quatro presidentes da República - o actual e três ex. E acho que não ouvi uma palavra acerca do movimento militar que nos devolveu a liberdade, mas sim apelos a uma união nacional tendo em vista combater a crise. De tal forma que o insuspeito dr. Passos Coelho observou que «uma União Nacional não é desejável para Portugal», sendo até uma «perversão» invocar o tema no 25 de Abril. Ao colocar maiúsculas onde os outros tinham posto minúsculas, estava a referir-se ao partido único da ditadura, a que ninguém quererá regressar. Terá sido um pouco demagógico, mas pelo menos o líder do PSD pôs o dedo na ferida ao acentuar que a sessão solene passara alegremente por cima de uma das várias razões por que se fez a revolução.
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Preferi ver outros programas que a TV deu nesse dia. Um deles lembrava alguns dos chamados capitães de Abril, não os mais mediáticos, mas outros que também deram o seu contributo para que coisas como a guerra colonial, a censura ou a polícia política desaparecessem de vez. E um programa acerca das brutalidades exercidas pela PIDE sobre mulheres que não eram terroristas nem homicidas, que no máximo se limitavam a fazer agit/prop.
Já começa a ser preciso contar mais de 50 anos para se ter sentido na pele o que foi a ditadura, pelo que bom é que ainda alguém, neste caso a TV, se preocupe em mostrar aos mais jovens aquilo que nós, os mais velhos, vimos, ouvimos, soubemos e sofremos. Afinal, naquele 25 de Abril comemorava-se o Dia da Liberdade, não o Dia Nacional da Crise...
