Com Agosto a mais de meio e as eleições legislativas a menos de um mês, a situação económica e social do país impõe que se dê por terminada a silly season. Não vai ser fácil. Toma--se-lhe o gosto. Dizer disparates é mais fácil que tentar articular análises sérias e ponderadas. A semana que passou foi, a esse título, exemplar. Os números de evolução do PIB foram bons? Foram! Não tanto pelo valor absoluto mas por comparação com outros países e com o que eram as expectativas. Mérito de quem? Nosso (leia-se, meu), diz o primeiro-ministro. Ora, ora! Mero efeito de arraste da conjuntura internacional (apesar do governo), brada Manuela Ferreira Leite. No meio deste ruído, Teixeira dos Santos, congratulando-se com os resultados, disse o óbvio: "Não significa que seja o fim da crise. Nada nos garante que seja sustentável. Há que persistir".
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No dia a seguir sairiam as estatísticas do emprego, o que aconselharia, desde logo, a que Sócrates tivesse sido mais prudente. Os números, tal como a generalidade dos economistas tinha vindo a prever, foram maus. A economia pode não ser uma ciência exacta, mas há rotinas que se vão compreendendo cada vez melhor. A teoria ajuda. Os dados e as técnicas estatísticas fazem o resto.
Voltemos aos números do desemprego. Sócrates fez avançar Vieira da Silva para as justificações. "Apesar dos esforços do Governo, os efeitos da crise internacional continuam a fazer-se sentir". Como era de esperar num jogo político rasteiro, o PSD acusa "Revela o falhanço das políticas do Governo". Para o folclore ser total só faltava mesmo Jardim vir pôr em causa os números do INE, ou melhor, o INE e ameaçar que se isto não mudava tinha de se fazer alguma coisa.
A Jardim já ninguém liga. Mal. Pelo cargo que ocupa, exige-se-lhe outra postura. Não pode continuar, impunemente, a insultar o primeiro-ministro, o ministro das Finanças, a pôr em causa a honorabilidade de instituições com prestígio internacional. Estranha-se, por isso, o silêncio do presidente da República, habitualmente tão cioso com a reputação e credibilidade institucionais. É verdade que, se disser alguma coisa, corre o risco de voltar a ser chamado senhor Silva. Mas será só por isso que não abre a boca? Perante os números desta semana, qualquer pessoa com um mínimo de bom senso reconhece que a verdade está algures entre o discurso de Sócrates e de Ferreira Leite. Quando assim é, a política sai desacreditada. Se toda a gente percebe que nenhum deles diz a verdade toda, por que não lhe convém, a política passa, definitivamente, a ser um jogo de faz de conta. Um exercício de retórica, sem qualquer relevância, na qual alguém como Jardim pode surgir como um herói. Ou, pior ainda, em que se desculpabilizam comportamentos condenáveis com o argumento de que "rouba mas faz".
Num contexto destes, é bom ler a entrevista de Ferro Rodrigues ao "Expresso". Pela clareza com que coloca as opções, pela honestidade com que se situa. Concorde-se ou não com as suas ideias, há ali coerência do princípio ao fim e sentido de dever. Tal como Teixeira dos Santos, Ferro Rodrigues mostra que é possível estar e fazer política de forma diferente. O que é tão mais importante quanto mais provável é o cenário de uma maioria relativa, a exigir quem saiba lançar pontes.