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A ética da reciprocidade é uma máxima moral que, em termos simples, se traduz no dito popular "não faças aos outros o que não queres que te façam a ti", ou se quisermos ver pela positiva "trata os outros da mesma maneira que gostarias de ser tratado" e, se quisermos continuar no campo dos provérbios, "quem semeia ventos colhe tempestades".
Vem isto a propósito da recusa do F. C. Porto em deixar que o ex-presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, entrasse no pavilhão Dragão Caixa para participar num evento organizado pela Caixa Geral de Depósitos e pela estação de televisão SIC. A maior parte das reações à decisão do clube foram negativas e o próprio Rui Rio veio considerar o assunto "um episódio lamentável".
É fácil de perceber que, em tempos em que impera o pragmatismo, a decisão do F. C. Porto tenha pouca aceitação. O mais fácil seria, por razões de ordem económica (a relação com os patrocinadores) e de imagem (a ideia de um clube em paz com os vários poderes da sociedade) o clube fizesse por esquecer as ofensas de que foi objeto.
E no entanto foi Rui Rio que fechou as portas da Autarquia ao clube e às comemorações dos títulos conquistados e que, pelo tal princípio da reciprocidade, só deveria legitimamente esperar igual tratamento por parte do F. C. Porto e de Pinto da Costa. Foi Rui Rio que desde o Plano de Pormenor das Antas escolheu uma estratégia de afastamento e confrontação com o maior clube da cidade.
Esta opção foi feita em nome do combate à promiscuidade entre o futebol e o poder, uma ideia aceitável, mesmo se, ao que tudo indica, os portuenses sempre souberam distinguir uma coisa da outra já que nas últimas quatro eleições autárquicas sempre deram a vitória a um candidato que não era apoiado pelo presidente do F. C. Porto. Mas se esta estratégia lhe granjeou uma boa imagem na capital e nos órgãos de Comunicação Social sediados em Lisboa, Rui Rio e quem o convidou deveria saber que a memória e a gratidão não caíram em desuso para os lados das Antas.
É óbvio que o F. C. Porto tem um péssimo historial nestas coisas de impedir entrada nos seus recintos, nomeadamente nas relações com a Comunicação Social e o seu direito de informar. Mas este não me parece ser o caso. Aqui é como se eu, dono de um restaurante, tivesse um vizinho que durante anos me tentou prejudicar o negócio e um dia decidisse entrar na companhia de um cliente para jantar. Podia ser um convidado mas o restaurante não deixaria de ser meu e eu permaneceria detentor do direito de admissão.
Memória e princípios podem estar fora de moda, mas continuam a fazer sentido.
*SUBDIRETOR