A manifestação em defesa dos direitos dos animais foi extraordinária! A adesão ultrapassou todas as expectativas, o entusiasmo, a convicção e o amor expressos por palavras, cantos e cartazes, numa cadeia solidária com os nossos amigos de quatro patas, transbordou para todos os que às janelas e nos passeios apoiavam a jornada.
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As imagens, que atravessaram fronteiras, fizeram-me evocar as emoções que envolviam as manifestações de entrega e apoio aos ideais de Abril. A força e o querer de todos os que aderiram à defesa dos animais de companhia significam que a esmagadora maioria da população absorveu os princípios humanistas, matriz da CRP. Repetindo-me, já falei do tema, o art. 1.ºdesta lei define Portugal "como uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária".
Haverá pessoa com dignidade que maltrate um animal de companhia? Poder-se-á imaginar uma sociedade justa e solidária que não defenda e proteja o bem-estar destes animais? Esses seres vivos não sofrem? Não sentem? Não se dedicam por inteiro a quem os acolhe? Não expressam emoções? Um ambiente de vida humano não exige a defesa do equilíbrio da natureza e do ambiente, dos quais fazem parte integrante os animais? Matar à fome, à sede, a pontapé, esventrar a sangue-frio um destes animais não é violar o ambiente de vida humano?
Quantas histórias verdadeiras se relatam sobre o cão dedicado que permaneceu à porta do hospital ou junto à campa do seu dono, esperando que este lhe faça uma carícia e voltem ambos para casa! Quantos idosos solitários se empenham em viver para receber e dar carinho ao seu companheiro de quatro patas, sempre leal e presente! Quantas crianças doentes têm no seu animal de estimação a motivação para o percurso de vida! Mas só os animais não são bem jurídico protegido constitucionalmente?
Até as empresas, enquanto pessoa colectiva, têm essa protecção. Os animais fazem parte da natureza e são suporte do ambiente ecológico, sadio e equilibrado, direito constitucionalmente consagrado no art. 66.o. Há milhares de anos que o ser humano buscou a companhia e dedicação de animais, domesticando-os a fim de os integrar no seu núcleo familiar, amando-os. Em pleno século XXI, em Portugal, país reconhecido como solidário e humanista, nega-se o direito de defesa de um ser vivo, que não tem voz, mas que "fala" com afeição, carinho e inteligência?
A liberdade e escolha individual da formação da família são direitos fundamentais dos humanos e os animais domésticos fazem parte dessa escolha, sendo inimaginável uma sociedade de cariz humanista, culturalmente interessada e cientificamente avançada sem eles. Não seria, certamente, uma comunidade bem-sucedida, equilibrada e sã. É pelos direitos do ser humano e do ser vivo, animal de estimação, que vale a pena continuar a lutar. Regozijo-me e revejo-me na força e convicção de quem publicamente defende o seu AMIGO de e para toda a vida.
*Ex-diretora do DCIAP
(A autora escreve segundo a antiga ortografia)