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1Uma pitonisa da Comissão Europeia solta um espirro equívoco sobre a necessidade de uma reforma laboral em Portugal e de imediato o nosso Governo dá sinais de ter contraído uma constipação. Ainda desorientados pelo febrão dos juros da dívida pública, os ministros desatam a desmentir-se uns aos outros e a si próprios, ou até a trocarem de pasta uns com os outros. Veja-se o caso da ministra do Trabalho, que não faz outra coisa que não seja contestar as ordens que chegam de Bruxelas: à cautela, o primeiro-ministro senta-a a um canto e convida em alternativa o ministro da Economia a explicar às centrais sindicais quais são as propostas do Governo para tornar mais baratos os despedimentos ou para facilitar o despedimento individual. Ou assim se julgava que seria, porque na verdade as reuniões terminaram e ninguém percebeu, nem os sindicalistas, nem os patrões, nem os portugueses, o que quer afinal o Governo. Parece, aliás, mas sem certezas, que quer tudo menos tornar mais baratos os despedimentos ou facilitar o despedimento individual. Ou seja, quer, mas não quer, fazer uma reforma laboral. Pelo menos até à próxima cimeira de um eurogrupo qualquer ou até à próxima chantagem do tal comissário Olli Rehn. Para citar Silva Peneda, presidente do Conselho Económico e Social, tudo isto é "um disparate completo".
2. Ramón Lobo, experimentado repórter do "El País", escrevia no seu blogue, por estes dias, uma daquelas frases que perduram. Dizia o jornalista espanhol que "o poderoso, seja político ou empresário, tem um acesso difícil à realidade. Só lhe contam o que quer ouvir; só vê o que encaixa na sua visão do Mundo". Veio-me à memória, a frase, quando relia as reacções aos resultados do PISA, estudo que avalia e compara, de forma independente, as capacidades dos alunos portugueses e de outros países da OCDE. E concluo que, no caso português, não é preciso ser poderoso, basta ser político, para ter dificuldades com a realidade. De acordo com comunistas e bloquistas, as melhorias na educação foram conseguidas "apesar" das políticas educativas do Governo, protagonizadas, recorde-se, por Maria de Lurdes Rodrigues. Ou seja, comunistas e bloquistas admitem que os resultados estão melhores, mas acham que medidas como o Plano Nacional de Leitura, o Plano de Acção da Matemática, as aulas de substituição, a Escola Tempo Inteiro, o Inglês no 1º Ciclo, o alargamento massivo da educação pré-escolar, as obras que por todo o país estão a transformar as escolas degradadas em espaços dignos, são apenas exemplos de má política. Pelos vistos, a única coisa importante para bloquistas e comunistas é continuarem a apropriar-se das dores dos professores, ainda e sempre por causa da avaliação. O disparate, como se vê, é contagioso.