1Foi notícia, esta semana, o facto de um grupo de estudantes universitários ter desfraldado uma faixa em que se podia ler "demite-te". Depois, quando os seguranças do primeiro-ministro tentaram retirar a faixa, este impediu--os, pedindo que "deixassem os senhores ostentar o cartaz sem nenhum problema".
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Não sei se será razoável que, num estabelecimento do Ensino Superior, onde o primeiro-ministro participava num seminário organizado pelo Sistema de Informações da República, os estudantes se manifestem dessa forma. Admito que sim, na medida em que foi um protesto silencioso, que não perturbou o decurso dos trabalhos. Em todo o caso, a eventual questão disciplinar só pode ser avaliada pela Universidade Nova de Lisboa e não parece, sequer, muito relevante. O que não deixa de ser paradigmático, contudo, é que o primeiro-ministro trate por senhores quem o tratou, desrespeitosamente, por tu.
Nos últimos tempos, a caça ao político transformou-se no principal desporto nacional, com desrespeito por quem ocupa funções de governação. Um desporto que vai sendo avaliado pela mediatização do ato, o que, naturalmente, favorece os exibicionismos. Para isso contribui a comunicação social que, obviamente, dá tanto maior cobertura quanto mais espetacular for o ato.
Compreendo a reação do primeiro-ministro, a bem da liberdade de expressão, acho que fez bem em recordar que temos uma democracia saudável. Desvalorizou um facto sem qualquer valor, retirando-lhe toda a importância. Mas, em todo o caso, e não se podendo exigir que o primeiro-ministro o faça, porque criaria um facto político muito conveniente para quem se exibiu dessa forma, alguém terá de dizer a esses estudantes que, ao tratarem por tu o chefe do Governo, que não anda com eles na escola, não foram nenhuns senhores, como depois foram apelidados, depois dos seus breves instantes de fama. Foram, apenas, malcriados.
2. A diretora da Inspeção-Geral da Administração Interna considerou que a atuação da Polícia, frente à Assembleia da República, no dia 14 de novembro, foi proporcional e adequada, em conformidade com as normas e procedimentos, e que a carga policial foi antecedida de avisos aos manifestantes para que dispersassem, e que foram ignorados.
Resta, apenas, a importante dúvida sobre a forma como foram realizadas as detenções, questão que Marinho e Pinto levantou na ocasião. Naturalmente, os detidos devem ter acesso aos seus advogados, e a um tratamento de acordo com a lei.
Mas, também, neste caso, há uma outra questão que, por razões que desconheço, ficou ignorada. Refiro-me ao facto, indesmentível e facilmente constatável nas imagens difundidas pelas televisões, de alguns dos curiosos que se confundiram com os manifestantes estarem acompanhados de crianças. Expuseram-nas a um ambiente violento, em que foram lançados petardos e pedras, bem como à carga policial, quando se recusaram a obedecer às ordens reiteradas para dispersar. Ora, independentemente do direito que assiste a cada um de praticar o "voyeurismo", o que aliás é outro desporto nacional em voga, como se comprova nas nossas estradas sempre que sucede um acidente, parece-me intolerável que a exposição de crianças a uma situação de grande perigo não mereça um castigo exemplar. Não consigo entender por que razão um cidadão é multado se a criança não for transportada, na sua viatura, nas severas e securitárias condições exigidas pela lei, e não é alvo de idêntica punição quando a expõe a uma manifestação violenta, com tudo o que ela comporta de risco. Não sei, sequer, se, para alguns, as crianças não funcionam como escudos humanos. Mas, se alguma coisa acontecer, se um dia suceder uma tragédia com uma delas, ninguém questionará os seus irresponsáveis progenitores. Para além do carpir tradicional, já sabemos que só as forças da ordem serão diabolizadas e responsabilizadas.