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Em 1900, Eça de Queirós (“A Correspondência de Fradique Mendes") clamava contra a perda do portuguesismo na nossa cozinha: "Onde estão os pratos veneráveis do Portugal português (…)? Tudo estragado! O mesmo provincianismo reles põe em calão as comédias de Labiche e os acepipes de Gouffé. E estamo-nos nutrindo miseravelmente dos sobejos democráticos do “boulevard” requentados e servidos em chalaça e galantina! Desastre estranho! As coisas mais deliciosas de Portugal, o lombo de porco, a vitela de Lafões, os legumes, os doces, os vinhos, degeneraram, insipidaram…"
Mais de um século depois, ouvem-se estas palavras por aí. Que não há onde se coma à portuguesa, que proliferam (para turistas) os estrangeirismos gastronómicos, que os locais de tradição foram substituídos pelos sem identidade, etc.
Tal depressão acerca do presente não representa a realidade porque injusta para muitos que, com enorme oportunidade e dinamismo, estão a oferecer a nacionais e estrangeiros uma cozinha de qualidade em ambientes dignos do presente. E quem quiser saber o que se passa, basta ver o programa “Viver Aqui”, do Porto Canal, para comprovar o que acontece Porto e Norte além, com dezenas de empreendedores anónimos que reabilitam estabelecimentos, respeitando os comeres antigos ou criando novos. Basta-me entrar na “Casa Diogo” – passe a propaganda, mas, em troca, recebo boas tardes – para me sentir num ambiente tresandando a Porto, a velhos hábitos de cozinha e a portuguesismo impregnando sabores, cheiros e olhares. Se lhes disserem que o comer bem morreu, não se deixem levar pelo bota abaixismo.
O autor escreve segundo a antiga ortografia