O dia amanheceu na Venezuela com uma lança vinda do Twitter a trespassar os céus da nação. O autoproclamado presidente interino, Juan Guaidó, convocou o povo e os militares para as ruas, procurando propagar na arena social um rastilho que foi ateando nos corredores do poder.
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Mas o movimento de insurreição que parecia capaz de derrubar o inamovível Maduro - a ponto de se especular que o sucessor de Chávez terá mesmo ensaiado uma fuga para Cuba entretanto travada pelos russos - acabou por não ter, pelo menos no imediato, o efeito definitivo e purificador desejado. A "Operação Liberdade" pode, na verdade, quedar-se por ser só mais um capítulo na lenta história de degradação e enfraquecimento do regime, como outros a que temos assistido, pese embora a grande carga simbólica da libertação de Leopoldo López, acérrimo opositor de Maduro, condenado a mais de 13 anos de cárcere em casa, depois da tortura numa prisão militar. Guaidó galgou terreno político, interna e externamente, mas Maduro continua a ter os militares que mandam no país do seu lado. E isso faz toda a diferença, porque é essa a real medida do músculo da opressão. Tragicamente, a velocidade de erosão do poder totalitário do homem que viu Hugo Chávez reencarnar num passarinho é inversamente proporcional à velocidade a que vai morrendo o povo esfaimado.
Nos cenários que se desenham, avulta a certeza de que a única solução capaz de evitar um banho de sangue será a retirada de Maduro e de seus apaniguados, seguida do estabelecimento de um acordo com Guaidó e Lopez que resulte numas eleições livres escrutinadas por uma entidade externa. Mas Maduro já deu provas suficientes de não se deixar comover com desejos alheios.
Sim, o futuro da Venezuela depende da tenacidade dos opositores ao regime e da resiliência da população, mas depende, também, de um alinhamento astral que poucos veem como provável. Que faça com que China, Rússia e Cuba, sobretudo, decidam estender a mão a um desfecho pacífico.
*Diretor-adjunto