Homer Simpson, um dos maiores especialistas vivos em preguiça, teoriza as vantagens da inação pregando que a tentativa é o primeiro passo para o fracasso. Confesso que fui episodicamente seguidor desta infame teoria e me refugiava na prateleira do meio, a dos Assuntos Pendentes, para adiar decisões. Foi há muito, quando a massificação do email ainda não tinha acabado com o longo reinado do papel na correspondência. Na altura, usavam-se muito as prateleiras metálicas a um canto da secretária. À chegada, os papéis aterravam na de cima. O expediente despachado repousava na de baixo. A do meio era uma espécie de Purgatório onde ficavam a marinar o convite para moderar um debate chato, o pedido de um prefácio para um livro de crónicas de um deputado ou a confirmação da presença num jantar vínico.
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O tempo encarregava-se de decidir por mim. Na inspeção periódica à papelada encalhada, constatava, com prazer, que à mingua de resposta, o deputado cravou o prefácio a outro, idem aspas para a moderação do debate e o jantar vínico já foi.
Tive momentos de cobardia até que me convenci que é melhor decidir mal do que adiar, dei as prateleiras metálicas a um colega e tornei-me no que sou hoje, uma pessoa que prefere correr o risco de falhar a manter-me firme no pântano.
É por essas e por outras que acho graça ao António Costa, que é a expressão viva da expressão popular (um pouco machista) de que um homem enrascado é pior que uma mulher grávida.
A Câmara de Lisboa estava vergada por um passivo gigantesco e insustentável? Costa não se atrapalha, nem adia. Decide.
Decide vender os esgotos de Lisboa por 100 milhões de euros à EPAL. Um golpe genial, esse de vender a todos os portugueses uma coisa que nos dá tanto jeito como sermos donos das canalizações onde circulam o xixi e o cocó dos lisboetas.
Decide vender à ANA (ainda pública) por 286 milhões de euros, os terrenos do aeroporto de Lisboa, cuja propriedade era, no mínimo, duvidosa. Uma manobra de se tirar o chapéu até porque Rui Rio não conseguiu um cêntimo de indemnização, apesar de ser claro que parte dos terrenos onde o aeroporto de Pedras Rubras foi construído eram da Câmara do Porto.
Os lixeiros iam fazer greve e deixar Lisboa a cheirar mal no dia de Stº António? Costa não se atrapalha, nem adia. Decide comprar a paz contratando 150 lixeiros, que vão custar 2,25 milhões de euros/ano. Claro que agrava o passivo, que ia em 1,4 mil milhões de euros (mais 10,5% que em 2012). Mas o detalhe não tira o sono a Costa, que sabe que não pode ser o substituto de Oblak na baliza do Benfica mas está convencido que neste outono vai ser o líder do PS e no próximo vai ser primeiro-ministro.
O que encanta em Costa é a capacidade de decidir, sem a olhar a meios. Claro que foi com idêntico desempoeiramento que Sócrates levou o país até à beira do abismo e que os Espírito Santo caminharam para a falência. Mas enquanto o pau vai e vem folgam as costas. É do Costa que o povo gosta. E se o povo gosta, por que é não hei-de eu gostar também?