Pode-se discutir a política de financiamento da educação. Mas não se pode isentar de responsabilidade famílias incapazes de assumir a responsabilidade educativa no plano cívico...
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Todos os anos, por esta altura, a história é a mesma. Não há jornal, estação de rádio ou de televisão que se preze que não dedique um espaço significativo aos custos da educação. Manuais, cadernos e outro material escolar custam sempre imenso. No total, a factura, a julgar pelas contas feitas por um pai, andará, no 1.º ciclo do Ensino Básico, pelos 250 euros por criança.
Apresentadas assim, sem qualquer enquadramento ou comentário, estas reportagens são um crime de lesa-pátria. Pode-se discutir se a política educativa deveria, ou não, incluir o financiamento integral da educação, abrangendo livros, material, alimentação e, acrescento eu, vestuário, nestes níveis educativos elementares. Contudo, se abstrairmos desta discussão política, importa comparar aquele custo com muitos outros em que as famílias incorrem e verificar a sua ordem de grandeza e de importância.
Proponho-lhe um exercício. Vá a uma grande superfície e observe o comportamento de compra de uma família "típica". Verificará, rapidamente, que uma parte substancial da factura (arriscaria dizer, pelo menos um quarto) é constituída por produtos supérfluos. Se a família às compras integrar uma criança em idade escolar, vai poder constatar que, por ela, enchia o carro com "junk food", desde as batatas fritas às barras de chocolate, passando pelo mais variado tipo bolachas e bebidas açucaradas (não é impunemente que Portugal é o país onde a obesidade infantil mais tem aumentado). Imagine que aquela família repete o ritual todos os meses. Multiplique os gastos por 12. O total dava para comprar os manuais e sobrava muito, sendo que estas despesas poderiam ser evitadas ou, pelo menos, substancialmente reduzidas sem que daí adviesse qualquer perda significativa de bem-estar.
Em Portugal, mesmo quando dizemos o contrário, continuamos a dar pouca importância à educação, atribuindo às despesas que com ela fazemos (que, na verdade, são um investimento) uma prioridade igual, ou mesmo inferior, a outras despesas correntes. Numa dessas reportagens, um pai, que se queixava do preço dos manuais, encolhia os ombros quando confrontado com o facto de o filho afirmar, taxativo, que não queria um caderno qualquer mas um, obviamente mais caro, associado a uma marca na moda.
Ou seja, pode-se discutir a política de financiamento da educação. Mas não se pode isentar de responsabilidade as famílias, aparentemente incapazes de assumirem a responsabilidade educativa no plano cívico e dos valores e delegando no Estado e nos professores toda a tarefa educativa.
Enquanto por cá nos entretemos com discussões bizantinas (ainda há tempos li uma notícia que considerava inaceitável os manuais terem subido 2% acima da inflação, i.e., onerando o orçamento em 3 ou 4 euros por ano!), nos países que recentemente emergiram no mercado mundial, as famílias fazem todos os sacrifícios para que os filhos tenham a melhor educação possível. A longo prazo é aí que se decide quem se desenvolve e quem fica para trás. A continuarmos assim, vamos vê-los passar. O que é tanto mais paradoxal quanto todos os estudos confirmam ser o gasto em mais educação um dos melhores investimentos que as famílias podem fazer em Portugal...