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O Governo quer fazer uma revolução nas leis laborais e aprovou um anteprojeto com mais de cem alterações ao Código do Trabalho, que vão desde alterações nos contratos a prazo, alargamento dos serviços mínimos da greve, novas regras para o teletrabalho e a possibilidade de os trabalhadores comprarem dias de férias. Maria do Rosário Palma Ramalho não quer deixar pedra sobre pedra na legislação do trabalho, o que, já se sabe, nunca é pacífico. No afã reformista mexeu num ponto especialmente sensível - o direito de os pais faltarem três dias ao trabalho, sem perda de remuneração, em caso de luto gestacional. Sendo um direito assumido pelas empresas, como em qualquer falta por luto, o que está em causa é o reconhecimento, por parte do Estado, da dor pela perda de um filho que não chegou a nascer.
A polémica estalou e o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social desdobrou-se em esclarecimentos. E foi clarificado que o apoio à mãe está garantido por via de outro mecanismo: a licença de 14 a 30 dias em situação de interrupção de gravidez, "um regime mais favorável à gestante", na linguagem fria e burocrática da tutela. Para isso, o artigo 38.º-A do Código do Trabalho será reformulado de forma a garantir que não restam dúvidas de que "em todos os casos de interrupção de gravidez deve haver lugar à respetiva licença", que é paga a 100%. Como o JN noticiou ontem, este ano, o subsídio por interrupção da gravidez foi pago a quase seis mil trabalhadoras e rondou os mil euros.
Se a situação da mãe está acautelada, o mesmo não acontece com a do pai ou acompanhante. Com o fim do regime do luto gestacional, um pai devastado pela perda do filho que não chegou a conhecer só tem uma opção: faltar ao abrigo da assistência à família, mas fica sem a respetiva remuneração. Numa sociedade que se quer socialmente evoluída, esta mudança não é apenas um retrocesso, é desumana e cruel. Porque pretende negar aos pais o direito a chorar.