Evoluiu muito o meu relacionamento com os bancos. Comecei por apedrejar as montras das agências, coisa de que não me arrependo (pelo contrário), pois era a expressão de uma justa revolta contra os odiados símbolos de um punhado de capitalistas raquíticos, que apenas enriqueciam à sombra dos favores do Estado Novo e à custa da sobre-exploração da generalidade dos portugueses e habitantes das colónias.
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Nos últimos 40 anos, Portugal transformou-se, para muito melhor, na geografia e regimes - político, económico, social e cultural -, e as minhas relações e sentimentos face à Banca foram evoluindo ao sabor das marés dessa mudança.
Fui um cliente nada exigente da Banca nacionalizada antes da profissão de jornalista e de uma precoce especialização em assuntos económicos me obrigar a iniciar uma viagem aos meandros do negócio bancário, que me foi inspirando uma catadupa de sentimentos complexos, que vão da inveja à admiração, passando pela repulsa e indignação.
A estes sentimentos somou-se o da irritação que se apoderou de mim ao ouvir o porta-voz do lóbi dos banqueiros ameaçar que nos obrigará a pagar uma comissão se Bruxelas persistir na intenção de, a partir de 2014, impor um teto (0,2% no débito e 0,3% no crédito) às taxas que a Banca cobra aos comerciantes por pagamento eletrónico.
A este propósito, é preciso avisar toda a gente que, em Portugal, essas taxas oscilam entre os 0,5% e os 0,8%, no débito, e os 1,47% (no crédito) e são das mais altas cobradas em toda a Zona Euro.
É preciso avisar toda a gente que a Banca ganha 56 cêntimos em cada transação com cartão de crédito, o instrumento que lhe proporciona o melhor proveito unitário líquido.
É preciso avisar toda a gente que os bancos lucram 90,6 milhões de euros/ano no negócio dos cartões e que, da última vez que foram contabilizadas, valiam 300 milhões de euros as poupanças com a substituição de operações ao balcão pelas efetuadas nas caixas automáticas.
É ainda preciso avisar toda a gente que o recuo de Faria de Oliveira (dizendo que fará tudo para não agravar as comissões aos clientes), além de aparente, é também mentiroso, pois os bancos já começaram a aumentar essas comissões: as anuidades dos cartões subiram 8,7% no primeiro semestre, três vezes mais do que a inflação.
Como estão proibidos por lei de introduzir comissões diretas por operação no multibanco, os banqueiros gananciosos preparam-se para entrar pela porta das traseiras, cobrando-nos encargos calculados em função do volume das operações bancárias e do valor total dos movimentos no multibanco.
Não podemos continuar a ser nós, contribuintes e consumidores, a pagar pelos erros, filhos da incompetência e/ou de favores a amigos, com que os gestores arruinaram o balanço dos bancos. Está bem que ganhem dinheiro, mas com um mínimo de dignidade e respeito pelos clientes. Para que a coisa não chegue ao ponto de me sentir obrigado a dar razão ao Mário Soares e voltar a encher os bolsos com pedras...