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É verão de São Martinho, mas dá aguaceiros, lá para o fim da semana. Nada, porém, que chegue à goela. Estamos em seca severa, rios e barragens estão à míngua, há restrições ao consumo de água e apelos à poupança. O tempo está a mudar. O clima destrambelha, aqui e acolá, por entre catástrofes e tragédias.
As alterações climáticas andam de par com o crescente consumo de energia. E é aqui que começam as escolhas: das políticas, dos governos, dos cidadãos, de cada um de nós, que consumimos energia e produzimos dióxido de carbono, esse veneno letal que respiramos no ar, a quarta causa da morte global: 3,7 milhões de pessoas a cada ano, por respirarem ar contaminado - mais que a soma das vítimas da malária, tuberculose e acidentes de trânsito.
É claro, o problema é global, mas cada país tem de fazer o seu caminho, honrando os compromissos. Como os de Paris (Cimeira do Clima) e, ainda agora, os de Bona, onde decorreu a Cimeira das Nações Unidas para as Alterações Climáticas. No final, o nosso ministro do Ambiente anunciou que "em 2030, em Portugal, não existirá mais produção de eletricidade a partir do carvão", um dos maiores poluentes atmosféricos. Mais do que um compromisso, todavia, o que este Governo está a dizer é que vai prolongar, porventura por mais uma década, o licenciamento das centrais de carvão, em Sines e no Pego, em cima do Tejo, junto a Abrantes, ambas em final de vida.
Desde que encerrámos a mina do Pejão que não produzimos um quilo de carvão. E, no entanto, Portugal importa todos os meses 5,5 milhões de toneladas desse minério poluente, para alimentar aquelas duas centrais. Pelo que, mais do que a moratória, o que se esperaria é que o Governo lhes anunciasse o velório, privilegiando o investimento em energias limpas, ao nosso alcance. Tal é o caso da energia elétrica que já produzimos a partir de fontes renováveis, ou seja do sol, do vento, da chuva, das marés e da geotermia - recursos que temos em abundância e que ainda mal exploramos.
Se o acesso e o controlo das fontes de energia definem em boa medida o grau de riqueza e de independência de um país, Portugal só pode queixar-se de si próprio, se continuar a desperdiçar os dons com que a natureza nos abençoa. E entramos no domínio das políticas públicas. Porque uma coisa é, como o fez um Governo lá atrás, concessionar a prospeção de petróleo na costa algarvia, onde queremos turistas. Outra, que se espera, é valorizar o que é nosso e apostar seriamente na produção de energias renováveis e na fileira industrial que lhe pode e deve ser associada. A produção e distribuição de energia elétrica em Portugal estão hoje nas mãos de capitais estrangeiros, maioritariamente chineses. Oxalá se lembrem de "cavar o poço bem antes de sentir sede". É do avô deles o ditado.
*DIRETOR