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A presente crise exige de cada um de nós, mais do que nunca, que sejamos competentes naquilo que fazemos, profissional ou civicamente. Numa sociedade civilizada, esse é o dever de cada um. Por cá, preocupamo-nos mais com o que os outros fazem ou deixam de fazer. Cultivamos a inveja e a maledicência. Nas conversas de cafés ou nos "blogs high-tech". Desde o cidadão mais simples ao intelectual mais presunçoso. Dizer mal é desporto nacional.
Alguém faz uma coisa bem e outra mal? Sublinha--se o erro. Esquece-se o acerto. Especializámo-nos em "crítica". Com subespecializações que vão da má-língua (cultivada explicitamente em programas, por isso mesmo inofensivos) à calúnia veiculada, sub- -repticiamente, em pretensos noticiários e "blogs" que se alimentam de, e fomentam, o boato. Em todos, com mais ou menos justificação, os "políticos" são os bombos da festa.
Frequentemente, o produto é primário. Incompetente. Ou não estivéssemos em Portugal... Mas faz danos. O que é grave.
Dou um exemplo. Entre os sítios que consulto está o "Times Online". A 2 de Julho, reparei num artigo sobre o Eurojust. Para minha surpresa, o primeiro parágrafo dizia: "O Serious Fraud Office (SFO) está enredado num fiasco que pode, inadvertidamente, ter definido a sorte de José Sócrates, o PM português, e determinar o resultado (...) nas eleições de Setembro". Depois de historiar, de forma muito crítica, o envolvimento do SFO nas investigações sobre o Freeport, evidenciando como o seu comportamento criou tensões com o par português, o artigo refere a derrota socialista nas eleições europeias, antecipando que o mesmo poderá acontecer nas legislativas "em grande parte devido à especulação e escândalo que rodeiam a investigação". E prossegue referindo que nomeação de Sócrates como suspeito, feita pelo SFO, é vista como descuidada. O SFO não sai nada bem na fotografia, sendo responsabilizado pelos problemas no funcionamento do Eurojust e, mais importante, na investigação da fraude a nível europeu. O artigo, na sua totalidade, pode ser lido em http://business.timesonline.co.uk/tol/business/law/article6619110.ece
Qual não foi, pois, o meu espanto quando, sexta à noite, vejo na TVI uma notícia em que o texto de introdução, disponível no sítio daquela estação televisiva, diz o seguinte: "O envolvimento do primeiro-ministro português no caso Freeport está a paralisar a acção da Polícia britânica, segundo o 'Times Online'". Em voz off, refere-se que, de acordo com aquele jornal, o facto de ter tropeçado no nome de Sócrates faz perigar a investigação. E, mais à frente, diz-se que no referido artigo as investigações redundaram num fiasco por poder influenciar as eleições. Isto antes de se adoptar o reverso da teoria da conspiração de Sócrates, referindo que o SFO, antes muito elogiado, não é um organismo autónomo mas depende do primeiro-ministro inglês, um socialista como Sócrates. Para não julgarem que estou a delirar, podem também consultar a notícia em http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/freeport-britanicos-socrates-serious-fraud-office-tvi24-eurojust/1073580-4071.html#.
Ouve-se, lê-se e não se acredita! A incompetência parece demasiada. Noutra qualquer profissão, daria lugar a um despedimento. Numa estação televisiva, aumentará o "share"? Até quando a impunidade se pode esconder por detrás da liberdade de Imprensa? Talvez, afinal, Sócrates tenha razão quanto à TVI!
P.S. O título do artigo reproduz, subscrevendo, uma exclamação de Manuel Pinho, um dos mais visados por práticas como esta.