Desde tenra idade, muitas crianças manifestam uma certa repulsa pela disciplina de Português. Não gostam de ler, não apreciam a gramática e fogem horrorizadas de qualquer exercício de escrita. O crescente consumo de ecrãs ainda as afasta mais da aprendizagem da língua materna. E isso terá consequências para a vida toda.
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Segundo o mais recente "Estudo de aferição amostral do ensino básico 2021 - descrição qualitativa dos desempenhos", realizado pelo Instituto de Avaliação Educativa com base nas respostas dadas nas provas de aferição por cerca de 49 mil alunos, os mais novos evidenciam dificuldades na leitura, na escrita e na interpretação de textos. Não se trata propriamente de um diagnóstico surpreendente, mas esse resultado arrasta consigo um alerta: precisamos de repensar o ensino do Português e reforçar as políticas públicas de incentivo à leitura.
Quem percorre os manuais escolares do primeiro ciclo confronta-se com vários textos que dificilmente conseguem atrair a atenção e o gosto dos mais novos por uma leitura prazerosa. O conteúdo é muitas vezes enfadonho e as perguntas nem sempre estão bem colocadas. É preciso incorporar nos manuais textos com alta ressonância na vida de todos os dias das crianças e que cruzem irreverentemente os seus interesses. Por exemplo: se elas tanto apreciam as tecnologias, poder-se-ia incorporar nos planos obras desse universo e puxar ao máximo por aquilo que sabem. E apreciam.
Também precisamos de introduzir na escola iniciativas que desenvolvam mais a leitura. A biblioteca de turma é uma excelente ideia, se integrar livros interessantes e um plano de exploração do que se lê que seja inovador, bem acompanhado e avaliado. As crianças, quando pequenas, devem sentir o prazer das palavras e o gosto pela escrita de frases que se desenvolvam em sintaxes que vão ganhando complexidade e perfeição.
Ainda que todos lhe reconheçam grande mérito, o Plano Nacional de Leitura necessita de reforço e de outra amplitude. Aproveitando tudo o que tem sido feito (que é muito!), é urgente criar novos caminhos. E envolver efetivamente os mais novos.
Portugal dispõe de muitos escritores que dedicam as suas obras às crianças e aos jovens. Se visitarmos os escaparates dedicados a esse tipo de livros, ficamos surpreendidos com a quantidade de títulos e com a qualidade da escrita. O Ministério da Educação deveria trabalhar mais com esses autores, implicando-os em atrativos programas destinados à escrita e à leitura.
O ensino do Português tem de ser mesmo uma prioridade, porque essa aprendizagem deixará marcas para a vida toda. Quem não aprende a escrever durante o período de escolaridade, dificilmente atingirá o domínio da escrita na vida adulta. E isso evidencia-se qualquer que seja a atividade profissional. Às vezes, percebe-se até numa breve mensagem de telemóvel.
Mais do que pensar em grandes mudanças, do que mais precisamos é de regressar ao básico: dar a ler bons textos e incentivar a escrever bem. E isso deve sempre corresponder a deleitosos momentos de aprendizagem.
*Prof. associada com agregação da UMinho