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Imagine-se que Passos Coelho era primeiro-ministro, Assunção Cristas vice-primeiro-ministro e o PSD e o CDS propunham medidas que beneficiavam fiscalmente os offshores, reduziam o investimento nos serviços do Estado e prejudicavam o normal funcionamento das escolas. O que não teria sido dito e escrito?
Com a Esquerda tudo isto se passa. Mas os pecados capitais à Direita, na geringonça passam a problemas estruturais ou equívocos justificados.
Em maio titulava-se: "Bloco desafia outros partidos a combater os offshores". Na encenação parlamentar, o líder da bancada Pedro Filipe Soares escreveu aos congéneres repudiando uma "realidade paralela protegida por sistemas fiscais extremamente permissivos e pala complacência geral dos estados". Recordou que "em 2015 saíram de Portugal mais de 864 milhões de euros para paraísos fiscais". Foi criado o grupo de trabalho que faria maravilhas orçamentais. Mas 5 meses depois, revelado ao Mundo o nascituro burilado pela geringonça, conheceu-se o OE2017, que incorporando o chamado imposto Mortágua contra os malvados dos ricos, eliminou afinal o imposto de selo que incidia sobre os imóveis detidos por offshores sediados em paraísos fiscais, isentando-os do pagamento de muitos milhões. Contas feitas, uma destas casas com valor patrimonial de 1,5 milhões de euros pagará menos 108 mil euros de imposto de selo. E se tiver um valor patrimonial de 2 milhões de euros, pagará menos 154 mil euros. Tanta conversa.
Como outras vezes no passado, é notícia que há escolas encerradas por falta de funcionários, atrasos na colocação de professores e as despesas das administrações públicas com investimentos diminuíram 11,5 %. Alguém tem visto a FENPROF ou a CGTP na rua? Não consta que Mário Nogueira e Arménio Carlos estejam a banhos algures na Venezuela comunista com que se encantam, apesar da desgraça para quem lá vive.
Quando Jorge Sampaio disse haver vida para além do Orçamento, corria o ano de 2003 e ao tempo a dívida pública pouco superava 50 % do PIB. Hoje, para a geringonça, tudo mudou. Não há vida para além do défice, porque quando tudo o resto é mau, só mesmo o défice pode servir. A economia estagna, a dívida bate recordes, o investimento interno e externo contrai-se e a austeridade que António Costa dizia que o PSD e o CDS tinham imposto "para além da troika" mantém-se no essencial sem essa troika e sem que ao menos seja suscitada a mais pequena dúvida existencial.
Imagine-se outra vez que a Direita mandava. É tão fácil ser de Esquerda em Portugal.
DEPUTADO EUROPEU