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A principal reflexão deste sábado devia incidir sobre a própria existência do dia de reflexão. Por um lado, uma campanha eleitoral pobre em ideias não nos deu grandes motivos para meditar. Por outro, nunca tantos eleitores votaram antes do tempo. É provável que para este sufrágio mais de 300 mil não tenham sido obrigados a refletir. Número, note-se, que não tem parado de crescer desde que a opção de antecipar o voto foi estendida a todos os cidadãos.
O país político continua, portanto, em modo de negação. Insiste na ficção. Num silêncio falso e numa introspeção inexistente. Não faz nenhum sentido. Poucos entendem a sua necessidade. É desapropriado, retrógrado.
Quem votou no dia 11, fê-lo em pleno turbilhão de campanha eleitoral. Com declarações políticas antes, durante e após exercer o seu direito. Estes boletins de voto terão o mesmo valor daqueles que serão depositados nas urnas no domingo.
A isto soma-se um absurdo ainda maior: a existência de um dia de silêncio num mundo permanentemente ligado. A Internet não reflete. Não pára. Não respeita sábados surdos e mudos. Sobretudo, não esquece. O mundo digital continua a funcionar em pleno, com algoritmos que reciclam conteúdos, vídeos antigos que voltam a circular e publicações que permanecem visíveis, partilháveis e estimuláveis. Basta abrir uma rede social durante o dia de reflexão para bater de frente num anacronismo legal.
É hora de refletir sobre o que significa refletir em democracia. E aceitar que, entre uma nova forma de distribuir e consumir informação e o voto cada vez mais antecipado, há tradições que já não têm sentido. Esta é uma delas.