Ecologia de riscos: a transformação da nossa abordagem à gestão do território
Quando, com meu amigo e colega Gianmario, visitámos os territórios inundados, em setembro de 2022, na região de Marche, em Itália, o testemunho de muitas das pessoas diretamente afetadas foi o seguinte: Durante o verão "ardemos", no outono estamos debaixo de água, e as nossas terras estão cada vez mais vazias das suas gentes.
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Este é o mantra que ronda os noticiários em todo o Sul da Europa, e Portugal não é exceção.
Portugal gasta, em reparação de danos provocados pelos acontecimentos meteorológicos, segundo estatísticas europeias (https://www.eea.europa.eu/data-and-maps/daviz/economic-damage-caused-by-weather#tab-chart_2), mais de 336 milhões de euros por ano, em média. O custo por habitante é de 32 euros, o custo por quilómetro quadrado é superior a 3500 euros. A mesma análise mostra que a cobertura do seguro é inferior a 5%. E assim os contribuintes pagam. O clima está a mudar e isso cada vez nos custa mais e de 230 vidas são perdidas a cada ano em Portugal.
No entanto, há muito que se pode fazer para enfrentar este problema. A gestão dos rios como um sistema permite criar áreas de recarga de águas subterrâneas, áreas de biodiversidade, produzir materiais e ao mesmo tempo criar rotas turísticas. A criação de pequenos charcos, integrados com as redes hídricas, não só permite a acumulação de água, como possibilita a produção de energia. A água pode acumular-se em pequenos reservatórios acoplados. Quando as fontes renováveis, produzem energia em excesso, bombeiam a água para os reservatórios que estão em altitudes superiores. Quando a energia é necessária, a água, que está nos reservatórios superiores, por queda nas tubagens que acoplam os diferentes reservatórios, faz girar uma turbina, produzindo deste modo energia elétrica. As microturbinas podem ser inseridas em tubagens, que produzem eletricidade ou energia mecânica, sem prejudicar os ecossistemas, e o mesmo também pode ser feito em aquedutos. As zonas de expansão fluvial podem ser concebidas como bacias de fito-depuração e simultaneamente produzir matérias-primas como por exemplo o cânhamo para a produção de cerveja e tecidos, arroz, e ervas aromáticas.
Tudo deve poder ser transformado em rendimento, escreveu Bill Mollison, o pai da Permacultura (que é um método para projetar sistemas agrícolas estáveis, equilibrados, autossuficientes e capazes de perdurar no tempo).
Para reduzir o risco de incêndio, podem ser criadas faixas corta-fogo, geridas pelos pastores, que os utilizam como pastagens, o que incentivaria o aumento do pastoreio. O iogurte de cabra tem alto valor agregado e um rebanho de 150 cabras é o suficiente para o sustento de uma família. O modelo permitiria criar uma rede de queijarias, gerando deste modo um rendimento adicional e reduzindo simultaneamente os riscos de incêndio.
Esta estratégia de adaptação às alterações climáticas é também uma estratégia de mitigação dos seus efeitos: baseia-se no incremento das espécies vegetais, que, para conseguir viver, capturam o dióxido de carbono.
* Doutor em Ciências Ambientais e professor externo de Sistemas Ambientais e Biomimética na Universidade IUAV de Veneza