A Galp Energia acaba de se associar às seis mais prestigiadas universidades portuguesas para a criação do Instituto do Petróleo e Gás (ISPG), uma entidade de investigação científica e desenvolvimento tecnológico (I&D) que, pela sua dimensão e ambição, é inédita em Portugal. Num país em que se fala tanto do papel das PME, pela sua predominância no tecido empresarial, venho hoje propor uma reflexão diferente, justamente focada na capacidade das grandes empresas gerarem e alimentarem ecossistemas de inovação que tão necessários são ao desenvolvimento da nossa economia.
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Nesta parceria com as universidades do Porto, Lisboa, Minho, Coimbra, Aveiro e Nova de Lisboa, o ISPG vai dedicar-se à I&D na fileira energética, em especial no petróleo e gás, assumindo desde logo uma vocação internacional. Assim, o Instituto foi apresentado nesta semana numa conferência no Brasil, onde se manifestou a intenção de abrir uma delegação naquele país.
O facto de a Galp explorar diversos blocos petrolíferos no Brasil está na origem da fonte de financiamento do ISPG. Com efeito, a lei brasileira impõe que 1% das receitas de exploração do petróleo seja canalizado para a I&D, o que significa cerca de 110 milhões de euros até 2017 e, imagine-se, uma perspetiva de mil milhões de dólares até 2025. Esta política de investimento no conhecimento num setor estratégico, que nos chega do outro lado do Atlântico, deveria ser inspiradora também para nós. Nunca percebi por que razão não se instituiu em Portugal o princípio das "compras públicas com inovação" ("innovative public procurement", na designação aceite internacionalmente), o que teria forçado que uma pequena percentagem do grande volume de investimento público realizado nos períodos de maior fulgor fosse canalizado para a I&D e para a inovação, tornando assim mais competitivos setores que estão, agora, em grande dificuldade.
É evidente que este modelo de financiamento do conhecimento funciona para setores e empresas de maior dimensão, justamente aqueles que têm a escala para induzir e dinamizar o círculo virtuoso: grandes contratos, grandes receitas, financiamento da I&D em parceria com entidades do sistema científico, geração de tecnologias inovadoras, criação de constelações de startups, que por sua vez nascem com vocação internacional, abrindo novos mercados. Este é um ecossistema que se autoalimenta, segundo um processo que se designa por "inovação aberta".
Embora não seja esta a tradição, existem em Portugal alguns exemplos que demonstram que é possível fazer mais. Num workshop em que participei há dias na escola de negócios AESE, em Lisboa, onde se discutiu a temática da inovação aberta, foram apresentados três casos emblemáticos protagonizados por três setores que, em boa hora, fizeram a opção de dedicar uma parte das suas receitas para o desenvolvimento de tecnologias que os tornaram mais competitivos, gerando assim pequenos ecossistemas de inovação. Trata-se da banca, com a sua SIBS, das farmácias, através da Associação Nacional de Farmácias, e das concessões rodoviárias, através da Brisa Inovação e Tecnologia. Neste último caso, a tecnologia da Via Verde ultrapassou há muito o segmento das autoestradas e está já presente noutras áreas de negócio como as gasolineiras ou os parques de estacionamento.
Voltando ao Instituto do Petróleo e Gás, importa atentar na vertente da língua. O português, no passado considerado uma severa limitação à internacionalização das nossas empresas, está a transformar-se numa arma poderosa, mercê sobretudo da fulgurante emergência das economias do Brasil e de Angola. São cerca de 250 milhões de falantes, distribuídos por todos os continentes, sendo já a língua mais falada do hemisfério sul. No petróleo e no gás, o português começa a transformar-se numa língua de referência, justamente devido ao facto de algumas das mais importantes reservas recentemente descobertas se situarem no Brasil, em Angola, em Moçambique e em Timor.
Einstein dizia que "na dificuldade reside a oportunidade". A presente crise europeia, que tanto nos afeta e aflige, não pode em caso algum motivar um divórcio com a Europa, mas tem servido para nos mostrar que existem além-mar outras oportunidades geoestratégicas, como os ecossistemas em português.