Uns alunos meus fizeram um trabalho sobre uma pequena empresa que produz o que os economistas designam por bens transaccionáveis, isto é, que podem ser facilmente objecto de comércio internacional como, por exemplo, vestuário, calçado, automóveis, computadores ou telemóveis. Se podem ser comprados e vendidos no mercado mundial, a concorrência tem também essa característica: uma empresa em Portugal pode estar a concorrer com outras localizadas em países de que antes nem se sabia a existência.
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Ao analisar as potencialidades e as vulnerabilidades da empresa, sublinhavam o facto de a mesma produzir um produto muito específico, para clientes com disponibilidade para pagar e anteviam a continuação do crescimento que já vinha a acontecer. Nem tudo eram rosas, porém. O empresário tinha uma vocação muito centralizadora e pretendia gerir e controlar tudo, o que limitava a margem de expansão da empresa. Paralelamente, havia uma escassez de mão-de-obra para um conjunto de tarefas base que a manufactura do produto exigia.
Sem entrar em mais detalhes, este exemplo serve para perceber algumas das limitações que enfrentam muitas das pequenas empresas que constituem o grosso da base produtiva deste país. Os seus empresários tiveram a ousadia de abandonar o trabalho por conta de outrem e a visão para anteciparem procura para produtos diferentes dos que até então faziam ou se faziam. Porém, no fundo não são muito diferentes dos seus trabalhadores - as estatísticas da educação apresentam-nos quase como irmãos gémeos.
Em interacção com clientes exigentes e mercados sofisticados e globais, alguns evoluíram, rodearam-se de profissionais da gestão, reservando para si a supervisão e o controlo. Outros pouco progrediram, aceitaram o risco de trabalhar para terceiros em troca de não terem de investir nas funções de criação ou de comercialização. Entre uns e outros, há quem hesite sobre qual o caminho a seguir.
A multiplicação destas empresas um pouco por todo o país, mas especialmente no Norte, explicou uma parte significativa do nosso crescimento. Portugal cresceu pela reprodução extensiva deste modelo. Comparado com países com níveis médios de educação semelhante, estamos melhor por termos uma maior taxa de actividade, sobretudo muito mais mulheres a trabalhar. Como não podia deixar de ser, atenta a qualificação dos trabalhadores e dos empresários, a produtividade é baixa. Como consequência, os salários também o são. O nosso PIB foi construído à custa de muito trabalho e pouco ganho.
Pode ser diferente? Para as empresas, conta não apenas o que se paga mas o valor do que se produz. Que depende da estratégia e da gestão das empresas e, aqui e ali, do correcto desenho de incentivos pelas políticas públicas. Não tenhamos ilusões: não vai ser de um dia para o outro que se altera a qualidade da gestão das empresas, nem a qualificação dos trabalhadores. Pensar o contrário é bonito mas não passam de desejos irrealistas, efabulações perigosas. Estas empresas, que fornecem emprego adequado às actuais qualificações de muitos trabalhadores, desempenham um importante papel no equilíbrio económico e social do país. Se não evoluírem, acabarão por morrer. Não justificam protecção. Mas também não precisam que as empurrem para a cova. Sobretudo quando o desemprego é tão alto. Enquanto o pau vai e vem...