Portugal tem agora uma mulher à frente do Ministério da Defesa Nacional. O comandante supremo das Forças Armadas, por inerência, é o presidente da República, misteriosamente ainda um homem, e os chefes militares também.
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Trata-se de uma académica, igualmente a primeira a dirigir o Instituto de Defesa Nacional até ser nomeada para a Avenida da Ilha da Madeira. Socióloga de formação - formou-se no ISCTE no ano em que eu estava a cumprir o serviço militar obrigatório ali perto do MDN -, e no Instituto Universitário Europeu de Florença doutorou-se em Ciências Sociais e Políticas com uma tese sobre políticas de integração de género nas forças armadas dos países da NATO. Tem sido, aliás, a questão da integração das mulheres nas instituições militares que mais a tem interessado enquanto dirigente institucional, aqui e lá fora, e como investigadora. Helena Carreiras não tem, por consequência, como não fazer um bom cargo, pelo menos bem melhor que o seu petulante antecessor, agora nos Negócios Estrangeiros. Até o indulgente Marcelo já estava farto dele. Em peças anteriores, a ministra foi apresentada nos termos da "correcção" em vigor. "Rompe barreiras" num "bastião muito masculino". Tem "alma de trekker" e olha para as montanhas como "uma inspiração de vida". Por outro lado, foi unanimemente elogiada por altos quadros militares e ex-militares que a consideraram mais bem preparada do que muitos dos homens que a antecederam na função. Que eu desse por isso, não vi em H. Carreiras um vislumbre daquelas "conclusões" - em H. Pluckrose e J. Lindsay, "Teorias cínicas" (Guerra&Paz, 2021) - que resultam do preconceito básico de que os homens, de uma maneira geral (de género, também), "são injustamente privilegiados e precisam mostrar grande arrependimento e de deixar de chatear toda a gente". Não. Carreiras com certeza não intui nos elementos masculinos da Forças Armadas constructos sociais obsoletos, como naquele debate em forma de livro que opõe H. Rosin e M. Down a C. Morain e C. Paglia. E por falar na Paglia, que decerto Carreiras conhece bem, é essencial que a ministra não permita à ideologia partidária, unidimensional e social de género minar a coesão militar. Tem a sua primeira prova de fogo com o envio de 222 militares para a Roménia, a fim de integrarem uma força NATO, de dissuasão militar, no âmbito do conflito ucraniano onde a NATO, impulsionada pelos EUA, tem ido mais longe do que talvez devesse. Esqueceram-se, contudo, de lhes colocar protecção antiquímica e antinuclear na bagagem. É Portugal, senhora ministra. É ir-se habituando.
*Jurista
O autor escreve segundo a antiga ortografia