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Comemorámos esta semana o bicentenário das faculdades de Medicina do Porto e de Lisboa, então chamadas régias escolas de Medicina, criadas por alvará de D. João VI. Vivia-se um período especialmente conturbado a nível político e social (Revolução Liberal do Porto em 1820, Constituição de 1822, anulada transitoriamente pela Vila-Francada em 1823, e perderíamos o Brasil nesse verão) e o país precisava de cirurgiões. A única escola médica, a de Coimbra, instituída aquando da própria universidade (1290), não era suficiente: Portugal precisava de mais médicos.
Duzentos anos depois, o país continua a precisar de mais médicos no SNS. O fecho de vários serviços de urgência durante este fim de semana é apenas o mais recente episódio, tão recorrente que já quase não é notícia, da falência de um dos pilares da nossa democracia. E do paradoxo que nos penaliza: o país investe importantes recursos na formação de qualidade dos seus médicos (cada um custará cerca de cem mil euros, segundo algumas estimativas) e depois não cria condições de trabalho atrativas para os reter. Veja-se o que aconteceu na semana passada. Foram colocadas a concurso 585 vagas para centros de saúde e apenas 231 dos 389 recém-especialistas de medicina geral e familiar concorreram. Uma taxa de ocupação de 39%. Por outro lado, o Ministério da Saúde não abriu todas as vagas pedidas pelas unidades de saúde.
Mais do que os profissionais, a situação lesa os doentes. O número de utentes sem médico de família voltou a aumentar em maio para 1,645 milhões, são agora mais 80 mil do que quando a atual ministra da Saúde tomou posse pela primeira vez em abril de 2024. Mais de 10% da população é empurrada para fora do SNS.