A Comissão Europeia decidiu ajudar Portugal e a Espanha a criarem condições para uma melhor interligação no mercado europeu de energia. Antes que esta decisão seja incluída em algum argumentário do debate político para convencimento dos eleitores, convirá sublinhar a coincidência de ter sido a anexação da Crimeia pela Federação Russa o acelerador deste sobressalto da União Europeia em defesa de interesses desleixados sob o antigo pretexto de que o nosso modelo de democracia garantiria tamanha supremacia moral que bastaria exportar tecnologia e respetiva posologia de valores para que o Mundo acabasse submetido ao eurocentrismo.
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Veremos se as respostas com caráter de urgência na integração do mercado da energia e na implantação da união bancária serão suficientemente eficazes para que a União Europeia possa superar debilidades resultantes de não ter conseguido construir politicamente um poder federador e por isso não ter sido capaz de controlar setores vitais e hoje claramente ameaçados por forças da globalização que não respondem aos arquétipos do nosso modelo democrático.
Até tal verificação em concreto, talvez valha a pena registar com alguma desconfiança que não fora a anexação da Crimeia e muito provavelmente a população da União Europeia passaria pelas próximas eleições sem alguma vez ser chamada ao debate sobre a dependência energética do exterior, a qual, nos atuais termos, projeta 80% até 2035. E menos ainda a discutir o detalhe, subitamente tornado tão atual, de 27% do gás consumido pelos povos da União ser fornecido afinal... pela Federação Russa.
Por muito bem que corram os processos em curso para dar músculo ao mercado da energia e implantar a união bancária, muito dificilmente conseguiremos combater a mais perigosa e dissimulada de todas as ameaças provocadas pela globalização: a do crime à escala planetária praticado por gangues, cartéis, máfias transnacionais e ainda, ou sobretudo, estados integralmente tomados por este tipo de organizações, alguns sediados precisamente na Europa Central e alguns resultantes dos escombros da União Soviética.
Dir-se-á que não há país, estado, federação ou confederação nos cinco continentes que, à partida, possa ser considerado imune ao tráfico de armas, de droga, ao cibercrime, à extorsão. É obviamente a mais pura das verdades. Mas não é menos verdade que, sem fronteiras, sem proteção política da moeda e com alguns estados mafiosos plantados nas vizinhanças, é sobre a União Europeia e o euro que mais parece recair a pressão do dinheiro sujo.
Esta permeabilidade da União à lavagem de capitais formados nos mercados negros das máfias - e que alguns analistas calculam ter superado 20% do PIB mundial - redunda num permanente e violentíssimo ataque ao euro [bom] e por essa via ao próprio modelo social europeu.