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Podia falhar tudo, menos as maternidades. Podiam até fracassar respostas inadiáveis, o ministro das Finanças rebentar com o Orçamento do Estado, o julgamento de Sócrates durar até à eternidade e a reforma da Administração Pública, mais uma vez, não sair do papel. Também não teria problemas se Marcelo resolvesse acabar a sua vida num mosteiro de clausura, o almirante ganhasse as eleições e mudasse a Presidência de Belém para o Alfeite, o Partido Comunista se tornasse social-democrata e André Ventura passasse a ter quatro ou cinco clones para poder dar entrevistas todos os dias a todos os canais ao mesmo tempo. Admito que tudo isso fosse possível de acontecer e menos chocante do que se falhasse o atendimento de uma mãe com um bebé pronto a sair da barriga, de uma mãe com contrações e medo que alguma coisa de mal lhe pudesse acontecer, como as águas rebentarem e ela não ter um lugar seguro para fazer força, não ter um sítio onde se sinta protegida, onde a placenta e o sangue possam escorrer sem vergonha, onde o seu príncipe ou princesa seja amparado, lavado, beijado, protegido. Pode falhar tudo, mas não o lugar onde nasce o futuro. Quando em Portugal faltam bebés, quando os incentivos à natalidade são uma prioridade de todos os governos, as mães não podem ter medo de engravidar por recearem que o seu bebé nasça no meio de uma rua, dentro de um Uber, numa ambulância ou que, pura e simplesmente, morra por falta de ajuda ou incúria. Não quero saber de aeroportos, energias alternativas ou do TGV, quando bebés continuam a morrer na via pública. Não faz sentido.

