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Há quem pretenda fulanizar a saída do município do Porto da ANMP, rotulando-a como um capricho e não como uma decisão democrática da Câmara do Porto, caucionada por uma deliberação positiva da AM da cidade que, no campo da percepção, colhe como acertada em boa parte dos portuenses. A democracia a funcionar parece ser um incómodo mas, na realidade, nada prende um município à ANMP senão a História e a ilusão de que 308 vozes juntas deveriam falar mais alto e melhor do que vozes soltas ou desgarradas. Infelizmente, a tez de importância que a ANMP teve, desde a sua criação, tem vindo a desvanecer-se e é, agora, rosa-pálida, lendo o futuro nas folhas do chá.
A subalternização da ANMP no processo de descentralização de competências do Estado para as autarquias é mais um capítulo na política de engodo que deseja que tudo corra mal na descentralização para que a regionalização não avance. Se há fulanização neste processo, não é de qualquer presidente de Câmara, mais ou menos descontente, solidário ou dissidente. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa, ambos parentes afastados do desígnio constitucional da regionalização que deviam abraçar - agora, com o álibi secundário de uma liderança do PSD que não a deseja -, chamam a si a responsabilidade de fulanizar a oposição. Basta olhar para todo o processo e deixar cair os números: a subdotação orçamental para a transferência definitiva e obrigatória de competências na área da Educação, negociada pelo Governo com a ANMP, é um escândalo.
A perspectiva de "esperar sentado" pela transferência de competências nas áreas da Saúde e da Acção Social, num momento em que pouco ou nada se sabe sobre a extinção das direcções regionais que transferirão competências para as CCDR, é impensável. A manutenção deste caminho irá matar a descentralização. Se isso era o pretendido, a cidade do Porto inaugura uma mini-explosão nos planos. Este é o momento político do Governo valorizar a ANMP, não a condenando ao fraccionamento, à lógica de "guichet" e à rarefacção de poder. A porta está entreaberta. O PS, com uma maioria absoluta, liderança e maioria dos municípios da ANMP, não pode definhar até às próximas autárquicas com os seus municípios a responder aos seus munícipes de uma forma completamente enfraquecida e desajustada. Que esta revolta produza a aceitação e a reconfiguração de um processo onde se transferem muitas responsabilidades, a quase total ausência de autonomia de políticas e, definitivamente, pouquíssimo dinheiro para as necessidades. Ao contrário dos centralistas que agitam os habituais "papões da crise", qualquer explosão ou bater de asas que agite esta não existência só pode ser positiva.
*Músico e jurista
(O autor escreve segundo a antiga ortografia)