Vários países têm sido abalados por protestos, quase todos tendo no aumento de preços dos combustíveis o pretexto imediato. É sintomático que quem protesta o faça contra o respectivo governo e peça a protecção de uma entidade mítica: o Estado. Mesmo na liberal Inglaterra, é a ele que também se dirigem, por exemplo, os camionistas.
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Ao contrário do que cá sucedeu, o discurso é, por lá, mais claro. Dizem eles que a situação se tornou insustentável. O aumento do preço dos combustíveis fez subir os custos. Como há muitos operadores, não o conseguem repercutir no preço do serviço. Se o tentassem, perdiam o cliente. As alternativas são a falência ou arranjar forma de reduzir custos. A diminuição dos impostos sobre os combustíveis é uma solução, tanto mais fácil, quanto não obriga a nenhuma reestruturação.
Este é o drama de uma actividade em que há uma multiplicidade de empresas a operar. O mesmo de muitas outras! Todos os dias encerram empresas na indústria, no comércio ou nos serviços, e nem por isso são notícia de primeira página. Ao desaparecerem, o seu negócio transfere-se para as que sobrevivem, ou cria uma oportunidade para aparecerem outras empresas, potencialmente mais eficientes do que as que existiam. É uma lei da economia de mercado que subjaz ao progresso económico, por mais que no imediato nos custe a compreender, e aceitar, o seu impacto sobre os perdedores. Ao Estado não compete interferir no jogo, protegendo quem já está em actividade. A sua responsabilidade é a de garantir que a concorrência é leal, criando incentivos para a diminuição da economia informal e para uma melhoria da produtividade, acautelando a existência de uma rede de protecção para as eventuais consequências sociais decorrentes das falências.
Esta é a teoria geral. E quando ocorre um choque? O aumento do preço dos derivados do petróleo foi intenso e súbito e afectou, desproporcionadamente, alguns sectores. Pergunta-se: diferente, no fundamental, do impacto da abertura do mercado do vestuário e calçado aos produtos chineses? Se algumas das empresas falissem, alguém acredita que haveria uma falta de capacidade de transporte? A resposta é não! Quando muito há uma razão para intervir. Aparentemente, por força de um "contrato" com o Estado, os transportadores não poderiam repercutir os aumentos dos preços dos factores no serviço final. Tem a vantagem de não alimentar a inflação mas revela Estado a mais, mais uma vez.
Some-se-lhe a concorrência. Nos transportes não funciona o "paralelismo de preços" que se verifica na distribuição de combustíveis. Ou melhor, para funcionar seria preciso que se apelasse a uma concertação de preços, violando a lei da concorrência! A vida das PME é difícil!
Perante todas estas dificuldades, é natural que os empresários usassem a seu favor a dependência da economia do transporte rodoviário. Os bloqueios ilegais foram o passo que lhes fez perder a razão. Na criação de mais uma associação empresarial limitaram-se a seguir a tradição que, no longo prazo, os enfraquece. No meio disto tudo, a solução final parece equilibrada: o governo não cedeu no ISP, liberalizou os preços, criou incentivos para a modernização das frotas. Do mal o menos!