Não teve honras militares nem publicação formal em "Diário da República", mas nem por isso a cerimónia fúnebre da regionalização deixou de ser um retrato ilustrado da inércia de um regime centralista subjugado à esfera de influência de dois partidos que tudo têm feito para manter na gaveta uma reforma de que o país precisa há demasiado tempo.
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António Costa prometera um referendo em 2024, mas Luís Montenegro pulverizou qualquer hipótese de convergência, ao anunciar que este não é o momento para se avançar nem com a consulta popular nem com essa demoníaca lógica administrativa. O novel líder do PSD escudou-se na conjuntura económica, mas não hesitou em apregoar que vai empreender uma liderança itinerante que inclui estadas de uma semana em todos os distritos para sentir o pulsar do país real (leia-se o país esquecido). Ora, juntando a isto o que disse o presidente da República (longe de ser um fã desta reforma), sobre a necessidade de estar garantido um "amplo consenso" partidário em torno do tema, quanto mais não seja porque uma lei-quadro das regiões exige a aprovação parlamentar de dois terços, eis que temos o caixão lançado à terra.
A regionalização não se vai fazer e é sobre este quadro realista que os autarcas têm de trabalhar, não alimentando fantasias ou sonhos húmidos de que um dia vai acontecer por qualquer imperativo fatalista. A descentralização em curso, longe de ser uma regionalização 2.0, é, ainda assim, o único instrumento político a que os gestores municipais e regionais podem agarrar-se nos próximos anos para fazer valer a sua agenda, numa fase que coincidirá com o festim dos milhões do PRR. A exigência deve, por isso, aumentar e não esfriar. E isso passa por centrar o debate nas políticas estruturantes e menos na gestão corrente de edifícios e horários de centros de saúde. Se não for assim, continuarão a esbracejar no engodo.
Diretor-adjunto