Há uma frase que sempre me causou enorme perplexidade e que oiço com insistência nestes meses: "tudo é feito em condições de segurança". Escutei isso sempre que alguém me disse que foi de férias, ao restaurante, ao ginásio ou a uma pequena confraternização. No final de dezembro, o Governo suspendeu parte das restrições e muitos falaram da importância dos reencontros em tempo de festas natalícias. O resultado disso está à vista.
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É fácil dizer que o poder político não está a controlar esta onda pandémica. É verdade, mas convém acrescentar que cada um de nós também não foi capaz de se gerir a si próprio e, por extensão, os outros. A partir da nossa esfera da ação, lá fomos tardando decisões, muitas vezes proclamando condições de segurança inexistentes ou reivindicando o direito a combater uma fadiga pandémica que se vinha espalhando como um certo ar de um tempo que queríamos afugentar.
Esta semana, a capa da revista britânica "NewStatesman" desenha-se a fundo branco sob o qual se faz cair a palavra "perda". Destaca-se aí o primeiro-ministro Boris Johnson que, no início da pandemia, assegurou que o país tinha meios para neutralizar rapidamente o vírus e que, no tempo de preparar os britânicos para uma nova vaga, os incentivou a sair de casa e a frequentar bares e restaurantes. Depois do Natal, já com a nova variante em circulação, foi à televisão pedir aos pais para não reterem os filhos em casa depois das férias do Natal. A dura realidade mostrou-lhe depressa a leviandade desses anúncios. Nesta altura, o país está confinado e conta mais de 100 mil mortos. "Quando as decisões tardam, as pessoas morrem", escreve-se.
Em Portugal, o primeiro-ministro fez o mais explícito "mea culpa" na "Circulatura do Quadrado" da TVI. Reconheceu que "está tudo péssimo". Sabemos porquê: tardámos a fazer regressar os portugueses a casa. Se na primeira vaga fomos céleres a promover o confinamento, agora houve hesitações, ziguezagues, declarações contraditórias. No entanto, o país não se faz apenas de decisões comandadas pelo Governo. Há resoluções que pertencem a outras instituições e a outros campos sociais e aí também não me apercebi de grande mobilização para que fossem tomadas medidas de restrição mais drásticas com muito mais recuo. No Natal, quando se anunciou o levantamento de restrições, também não escutei grandes reservas a isso.
Nesta vaga, que é a mais séria de todas, falhamos todos. Que saibamos agora remar contra esta maré tão violenta. De forma determinada. Só assim nos salvaremos.
Professora Associada com Agregação da UMinho