Vários são os pilares ou poderes em que se apoiam o estado de direito e a sociedade democrática. Os tribunais, as forças armadas, as polícias, os serviços de informações, as igrejas, os partidos políticos, os órgãos de comunicação social e os sindicatos, entre outros de menor relevância.
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Os estados contemporâneos organizaram-se como estados de direito democrático; de direito porque subordinam o seu funcionamento à lei e ao direito e democráticos porque se abriram definitivamente à participação dos cidadãos, ao pluralismo e à alternância do poder. O direito e a democracia estão numa espécie de relação sinalagmática, ou seja, estabelecem entre si um vínculo de reciprocidade segundo o qual um não é possível sem o outro. Um estado só será de direito se e na medida em que for democrático e só será democrático se e na medida em que for estado de direito.
Debrucemo-nos, por ora, apenas sobre dois daqueles pilares.
O principal suporte de um estado de direito é o poder judicial, ou seja, os tribunais. A eles incumbe a administração da justiça, sem a qual não haverá paz social, sem a qual não haverá segurança. Os Tribunais são a derradeira instância de regulação da vida social e do próprio funcionamento dos órgãos do estado. De tal maneira é importante o papel dos tribunais que se pode afirmar com propriedade que nada funcionará bem num país onde eles funcionem mal.
Infelizmente em Portugal, o poder judicial escapa a qualquer escrutínio democrático, ou seja, transformou-se num estado (totalitário) dentro do próprio estado (democrático). Os tribunais são locais onde frequentemente se cometem algumas das piores ilegalidades e atropelos ao direito, bem como algumas das mais chocantes violações dos direitos humanos. Os cidadãos não podem confiar num sistema judicial em cujos tribunais prevalece mais o arbítrio das vontades individuais dos magistrados do que a certeza jurídica das leis da República. As principais causas dessa degenerescência são o sindicalismo nas magistraturas, sobretudo nos juízes, que fez com que titulares de um poder soberano actuem sob a orientação de sindicatos e cheguem a fazer greve às suas funções soberanas. A excessiva juventude e a total irresponsabilidade dos magistrados, bem como a sua politização são também factores da descredibilização dos nossos tribunais.
As igrejas têm igualmente um papel relevantíssimo como suporte do estado e de dinamização da sociedade em geral, sobretudo nos países onde, como o nosso, uma delas é claramente hegemónica. Historicamente, em Portugal, a Igreja Católica tem desempenhado esse papel de forma preponderante, mas pleno de contradições. Primeiro foi determinante na fundação e consolidação do estado bem como na criação de uma forte identidade nacional. Durante séculos deteve o monopólio do conhecimento e da sua transmissão, pois detinha o exclusivo do ensino, sobretudo o universitário.
A Igreja Católica está ligada a muito daquilo que de bom e de mau marca a nossa história colectiva. Nas épocas de ditadura, a igreja actuou quase como um poder sistémico tal foi a sua proximidade e cumplicidade com o poder político. «Abençoou» coniventemente os regimes políticos ditatoriais, nomeadamente, o Estado Novo, e quase sempre se deu mal com a democracia (pelo menos a sua hierarquia). A revolução democrática do 25 de Abril modificou esse estado de coisas. A Igreja, depois de algumas convulsões, aceitou a separação do estado e a perda de alguns privilégios concordatários e passou a ter um papel determinante na sociedade, suprindo algumas das insuficiências do próprio estado, sobretudo no domínio das acções humanitárias. A ela se deve muito do que de positivo se faz hoje no combate à pobreza e à miséria em Portugal. Tal como no passado (como poder) a Igreja continua hoje (como contra-poder) a desempenhar uma importantíssima função na vida social e no próprio funcionamento do estado.
Curiosamente, se exceptuarmos a I República e o Iluminismo pombalino, nunca a Igreja Católica Portuguesa esteve tão afastada do poder político e, talvez por isso mesmo, poucos terão sido os períodos em que foi tão poderosa como hoje.