Ronaldo tem imensas qualidades, mais ainda defeitos, que já por várias vezes assinalei e critiquei com veemência. Desta vez, uso estas linhas para demonstrar solidariedade com o uso abusivo que se dá ao nome. Ronaldo disto, o Ronaldo daquilo. Desta vez, foi Montenegro a tentar apanhar boleia do capitão da seleção, para pedir mentalidade vencedora ao país. Quem ouve aquela mensagem de Natal vê modernidade, crescimento, oportunidades e desenvolvimento. Aliás, o primeiro-ministro afirma que "estamos bem". Mas que é preciso "jogar para ganhar", em mais uma bolorenta metáfora futebolística, para ficar melhor.
"Estamos bem", quando fala de um país com "salários mais altos", mas jovens qualificados - e até com anos de experiência - ganham salário mínimo. A nova lei laboral não virá melhorar isto. "Estamos bem", afirma, num país em que ter uma casa para viver é um calvário e as medidas que adotou agravaram o problema. "Estamos bem", quando os transportes públicos continuam a ser um problema ambiental e de qualidade de vida. "Estamos bem", quando as urgências estão a abarrotar e com filas intermináveis. "Estamos bem", com mulheres a dar à luz em ambulâncias.
E aquela farpa do crescimento que "não cai do céu", dita a uma população que já está entre as que mais horas trabalha no espaço europeu? Seremos o 7.º país da UE com mais pessoas a trabalhar mais de 60 horas por semana. Trabalhamos mais 64 horas por ano do que a média europeia. Se calhar, a mensagem deveria ser dirigida a um grupo mais restrito de políticos e gestores, mas não a quem trabalha que se desunha. E já que falamos em Ronaldos disto e daquilo, não havia um "Ronaldo da Saúde" empurrado para a rua, pela "ministra João Félix" da Saúde?

