A maior ou menor força do PSD como polo bipolarizador do poder político em Portugal, decorreu sempre da forma como se equilibraram duas visões da realidade partidária.
Corpo do artigo
Uma, claramente centralizadora, defensora da consolidação de um pequeno/médio partido de quadros, desconfiada do estado social, defensora do "status quo" económico filho do bloco central, hiperconservadora em política de costumes.
Outra, mais "basista", defensora da coesão social de cultura europeia, crente na economia liberal de mercado, tolerante e aberta nas questões de consciência socialmente fracturantes.
A ascensão ao poder e, principalmente, o exercício e perenidade do seu exercício estiveram sempre ligados à forma como estes dois poderes coexistiram.
Sempre que o primeiro foi maioritário e dominante, o PSD cindiu-se (cisma das "opções inadiáveis", liderado por Sousa Franco), teve presenças limitadas e mal sucedidas de liderança política (ex: ciclo 2002/2005) ou esboroou-se em projectos fracassados antes ou depois de eleições (ex: lideranças de Marcelo Rebelo de Sousa ou Manuela Ferreira Leite). Com a agravante de terem sido períodos, com a excepção do comandado por Marcelo, de intolerância e marginalização de adversários internos (recorde-se o recente episódio de exclusão de Passos Coelho e Miguel Relvas das listas de deputados, em contraste com o exercício "basista"de Nogueira, que colocou o seu principal adversário - Durão Barroso - como cabeça de lista por Lisboa).
Com o segundo maioritário aconteceram dois cenários diversos. Um de insucesso relativo, por impossibilidade de encontrar pontes de consenso com o tal núcleo dito mais "urbano" da vida partidária (ex: lideranças de Fernando Nogueira e de mim próprio) ou pela descaracterização decorrente de cedências de princípio face à força desse sector partidário (ex: a liderança de Marques Mendes).
Os cenários de sucesso, nomeadamente o protagonizado por Cavaco Silva, foram os que coligaram ambas as tendências, mas com clara predominância da maioritária e mais ligada à tríada de propósitos que constituem a síntese da matriz ideológica do partido.
Foi também por considerar que Passos Coelho podia materializar esse tipo de unidade que o apoiei. Passadas duas semanas estou optimista quanto ao futuro do PSD. Os primeiros sinais apontam no sentido certo.
Partilhar o poder com tolerância é positivo se não se tergiversar nas opções fundamentais.
A inclusão de Aguiar Branco e de Paulo Rangel são sinais positivos mas talvez excessivos na forma, todavia, dá-me particular tranquilidade verificar que a Secretaria Geral fica nas mãos de um profundo conhecedor da realidade partidária e que, independentemente das nossas confrontações recentes, os próximos líderes do Grupo Parlamentar, Miguel Macedo, e do Conselho de Jurisdição Nacional, Calvão da Silva, são filhos do mesmo ramo partidário com que sempre me identifiquei. Também aplaudo que na Comissão Política possam harmonizar-se anti "menezistas" radicais, com alguns dos seus mais incondicionais apoiantes (ex: Paula Teixeira da Cruz e Marco António Costa).
Se fosse possível dar uma imagem da construção de base do projecto Passos Coelho, diria que assumiu com sentido de oportunidade a base de apoio "nogueirista" (de onde emanaram o "mendismo" e o "menezismo") e pincelou-a com uns toques subtis de um "cavaco-barrosismo"minoritário mas influente!
Estas duas semanas passaram ainda outros importantes sinais: parcimónia nas palavras, controle acizado da informação e gestão das expectativas para as intervenções do novo líder no Congresso deste fim-de-semana. Tudo isto é bom augúrio, coma reserva que decorre de já ter visto baquear muitas boas intenções.
Quinze anos depois poderemos estar a refazer um PSD de poder e capacidade reformista. De uma forma ou de outra todas as lideranças PSD da última década e meia são mães desta solução, mas sejamos sérios, algumas não se reverão nela. Eu revejo-me, apoio-a e estou disponível para colaborar no sentido de a tornar bem sucedida. Portugal precisa de uma alternativa à actual governação e ela só poderá surgir deste lado da barricada político partidária.
PS - por sentido de justiça, apesar da omissão objectiva quanto ao seu sentido de voto, admito que o consulado de Marques Mendes também terá dado um contributo positivo para se ter chegado à arquitectura desta solução.