Europa 2030, coesão territorial e criatividade regional
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No passado dia 9 de maio, numa sessão comemorativa do Dia da Europa e no âmbito do Projeto Escola da Coesão da CCDR-Alentejo tive oportunidade de apresentar o meu livro intitulado Coesão Territorial e Criatividade que será, também, o manual de formação para os futuros alunos e monitores da Escola da Coesão. Na ocasião fiz vários comentários ao livro e é uma breve síntese desses comentários que trago agora ao conhecimento dos leitores.
Nesta síntese, são dois os planos de análise. No que diz respeito à política de coesão territorial refiro-me aos fatores de condicionalidade que afetarão, no plano europeu, a próxima geração de fundos europeus e, portanto, o próximo período de programação plurianual pós-2027 cuja preparação está para breve. No segundo plano abordo os fatores de criatividade da política regional dos Estados membros que decorrerão desses mesmos efeitos de condicionalidade da política de coesão.
Os fatores de condicionalidade da política de coesão pós-2027
Em primeiro lugar, a mudança das regras orçamentais do pacto de estabilidade no sentido de uma maior diferenciação dos programas de estabilidade nacionais em linha com a política conjuntural e as reformas estruturais de cada Estado membro.
Em segundo lugar, a mudança das regras de sustentabilidade do pacto ecológico em linha com as metas de neutralidade carbónica e as novas métricas de sustentabilidade.
Em terceiro lugar, a mudança nas medidas regulatórias do pacto digital com as novas leis do mercado e serviços digitais e agora, também, da inteligência artificial.
Em quarto lugar, a mudança eventual das ajudas de estado e outros incentivos nacionais e europeus em matéria de política de reindustrialização europeia.
Em quinto lugar, a mudança das regras de harmonização legislativa e fiscal em matérias de política de novos recursos próprios da União Europeia.
Em sexto lugar, as novas regras de mutualização da dívida conjunta europeia no âmbito de novos financiamentos extraorçamentais, por exemplo, em matéria de segurança e defesa.
Em sétimo lugar, as novas regras aduaneiras, comerciais e de investimentos em consequência de um novo quadro geopolítico de relações com a China, os EUA e outras áreas geográficas da economia internacional.
Em oitavo lugar, que meios financeiros irão ser afetados à política europeia de segurança e defesa (PESD) no quadro da guerra e do pós-guerra entre a Ucrânia e a Rússia?
Em nono lugar, que meios financeiros irão ser afetados à política de vizinhança europeia e ajuda internacional no leste e sul da Europa, em especial, no Grande Médio Oriente e na margem sul do mediterrâneo?
Por último, que meios financeiros irão ser afetados à reconstrução da Ucrânia e às ajudas de pré-adesão do futuro grande alargamento ao leste europeu?
Todas estas alterações terão profundos impactos orçamentais e duas políticas europeias mais convencionais serão particularmente afetadas, a política de coesão territorial e a política agrícola comum que, em conjunto, representam praticamente dois terços do orçamento europeu. Nada será como dantes nas dotações dos fundos europeus e para antecipar muitas dessas mudanças muita criatividade nas políticas regionais será necessária.
Os fatores de criatividade das políticas regionais de coesão
Em primeiro lugar, uma criatividade estratégica e programática para antecipar os impactos estruturais das grandes transições sobre os territórios regionais. Falo das transições climática, energética, ecológica, tecno digital, demográfica e migratória, geopolítica e securitária, socio laboral e socio cultural.
Em segundo lugar, uma criatividade sistémica e operacional para pôr em ordem todos os novos custos e benefícios que decorrem daqueles impactos e que alteram substancialmente os custos de oportunidade dos territórios regionais. Falo de custos de contexto, de formalidade e certificação, administrativos e burocráticos, de cobertura de riscos, de regulação e supervisão, de crédito e garantia de crédito, etc, que, no conjunto, mudam a competitividade das regiões.
Em terceiro lugar, uma criatividade cognitiva e científica no que diz respeito à forma de observar e abordar os problemas, pois não podemos resolver problemas novos com conceitos velhos.
Em quarto lugar, o modo criativo de abordar a modernização ecológica no que diz respeito ao pacto ecológico, em especial, o modo de tratar as internalidades e externalidades da economia circular.
Em quinto lugar, o modo criativo de abordar a transição digital, em especial no que diz respeito à smartificação dos territórios regionais e, em particular, à formação das plataformas analíticas territoriais da estratégia nacional dos territórios inteligentes (ENTI).
Em sexto lugar, o modo criativo como desenhamos as hiperligações entre economia produtiva e economia da cultura, em especial o modo como articulamos as inteligências emocional e racional no tecido capilar do território.
Em sétimo lugar, o modo criativo como abordamos e resolvemos o atrito político-administrativo, em resultado da transferência de atribuições, competências e recursos e tal como parece decorrer da atual instabilidade governativa e inércia administrativa.
Em oitavo lugar, o modo como fazemos a escolha dos líderes dos territórios regionais, em particular os critérios 4C - conhecimento, cultura, cooperação e comunicação – que são decisivos para montar o sistema operativo da política regional e a interoperabilidade dos seus vários subsistemas regionais.
Notas Finais
A terminar, duas notas finais, também elas criativas. A primeira reporta-se à economia do Programa de Recuperação e resiliência (PRR). No meu entendimento, existe um potencial imenso de criatividade expresso na filosofia e prática das agendas mobilizadoras e consórcios empresariais que, com as devidas adaptações, pode ser transposto para os programas operacionais regionais (POR) de modo a criar um tecido empresarial mais articulado e interoperável. A segunda nota tem a ver com uma dimensão da política de coesão que precisava de ser mais claramente explicitada e apoiada por conter, igualmente, um potencial criativo imenso. Falo do reforço da Europa das Cidades e das Regiões e, em particular, das várias redes de cidades e regiões que podem funcionar como pontos de aplicação de programas europeus e inter-regionais de uma verdadeira economia criativa e colaborativa. Em tempo de eleições para o Parlamento europeu este seria, seguramente, um tópico com muito impacto eleitoral. Fica a sugestão.