Europa: A palavra aos candidatos
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O ponto médio do período de campanha eleitoral para o Parlamento Europeu coincide como o fim do programa de assistência e "saída" oficial da troika. Portugal e a Europa estão ao rubro naquele que é um autêntico ponto G para analistas, comentadores e media. O debate, contudo, está demasiadamente desfocado. Muita política interna e pouca política europeia, quando se exigia o contrário.
Esta é, seguramente, a eleição europeia mais importante para os países da periferia. Por muito que o Governo e alguns (poucos) economistas da nossa praça procurem dar como certa a sustentabilidade da dívida nacional, a inversão da recessão e a solidez da recuperação, desde logo colocadas em dúvida pelos dados da evolução da economia no primeiro trimestre de 2014, a verdade é que o futuro depende essencialmente do caminho que o projeto europeu vai trilhar nos próximos cinco anos. É por isso que os portugueses têm o direito de conhecer as opções que se colocam e a posição das candidaturas ao Parlamento Europeu.
O estado de agonia da Europa, que vai empurrando com a barriga os problemas e as reformas estruturais, nada decidindo, comporta um extraordinário risco de fragmentação. As consequências vão-se manifestando paulatinamente, como sejam a desqualificação social, económica e geoestratégica da sua periferia, gerando tensões políticas intraeuropeias, para além de outros fenómenos preocupantes como a ascensão de uma extrema-direita xenófoba.
O diagnóstico clássico da atual crise europeia, oriundo de um núcleo dominante encabeçado pela Alemanha, bate sempre no percurso de endividamento dos países da periferia. Isenta de culpas os credores, que emprestaram irresponsavelmente, os privados, cuja dívida ultrapassa em muitos casos a dívida soberana dos seus países, e, por fim, procura ignorar os defeitos genéticos do projeto do euro. É que a cedência por parte dos estados-membros do poder soberano de emissão de moeda e, consequentemente, da capacidade de controlar o seu valor por via das taxas de câmbio não foi complementada por um modelo de soberania partilhada à escala europeia, com competências nos domínios fiscal e orçamental. Os graus de liberdade subtraídos a todos os estados da Zona Euro acabaram capturados por um sistema financeiro sem rosto, onde muito poucos têm capacidade de intervenção. Acresce a tudo isto um Banco Central Europeu (BCE) cujo mandato, na leitura restrita de alguns estados dominantes, se resume à manutenção da estabilidade dos preços, ainda por cima tendo por referência um valor perigosamente baixo da inflação de 2%.
Percebe-se que, com este limitado portefólio de mecanismos de intervenção, a Europa e a Zona Euro não serão capazes de romper o ciclo vicioso. Importa, então, perceber as opções.
É difícil imaginar um projeto para a Europa que não passe por um conceito federalista, seguramente não tão intenso como o norte-americano, mas que assegure os princípios de coesão e solidariedade fiscal, orçamental e bancária necessários a uma verdadeira governação política e económica à escala europeia.
A forma temerosa e inconsequente com que a União Europeia abordou temas como a taxa Tobin ou os "project-bonds" faz supor um futuro difícil e incerto. A Comissão Europeia, que nunca foi politicamente forte, tem perdido relevância em favor da lógica intergovernamental. Cabe ao Parlamento europeu liderar um movimento de mudança que force as reformas e, assim, viabilize o projeto europeu e a estabilidade do euro. Dito isto, este é o momento de colocar as cartas em cima da mesa e ouvir dos candidatos ao Parlamento Europeu o que pensam das matérias críticas que estruturarão o futuro da união.
Os partidos e os seus candidatos têm o dever de explicar aos portugueses se suportam uma união fiscal que permita financiar um verdadeiro orçamento comum da união, que cresça para um mínimo de 5% do PIB europeu. Se pugnarão pela mutualização da dívida dos estados acima de um determinado patamar (60% do PIB ou outro). Se pretendem que o BCE possa adquirir dívida no mercado primário na forma de "eurobonds", de forma a prevenir as lógicas irracionais (e especulativas) dos mercados. Se aceitam a legitimação do presidente da Comissão Europeia através da eleição direta, abrindo assim portas para uma verdadeira governação político-económica europeia.
Para estas ou outras opções, têm a palavra os candidatos. Na semana de que ainda dispõem.