Com a revelação dos nomes dos primeiros candidatos que os dois maiores partidos nacionais vão apresentar ao Parlamento Europeu, abriu-se a campanha eleitoral. Paulo Rangel e Francisco Assis são dois intelectuais respeitáveis, portadores de uma já longa experiência política que inclui adequado tirocínio pelas instituições europeias. Bem cedo, trocaram uma efémera experiência profissional pela profissionalização política. Pertencem à geração dos respetivos líderes partidários e por eles foram respetivamente derrotados nas últimas eleições internas. Partilham a visão cosmopolita, a abertura europeia e a cultura política democrática do regime instaurado pela Revolução de Abril de 1974 que apenas faz parte das suas memórias de infância. São alheios às glórias e aos ressentimentos da ditadura e do processo revolucionário que definitivamente a enterrou. São detentores de idênticas aptidões discursivas, equivalente poder de argumentação, comum familiaridade e presença assídua nos meios de Comunicação Social. Ambos dirigiram os grupos parlamentares do Partido Social Democrata e do Partido Socialista, respetivamente.
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Encontram-se, portanto, nas condições ideais para exibir o que substancialmente os distingue e para tentar demonstrar aos cidadãos eleitores que essa diferença é constitutiva de reais alternativas cujo destino o ato eleitoral de 25 de maio de 2014 se encarregará de decidir. Convém lembrar, a propósito, que o "centro político" representa a equidistância de coisa nenhuma, a negação da diferença, do conflito, da política. Pelo contrário, é no confronto de múltiplas propostas e alternativas, da sua clareza, da sua consistência intrínseca e do seu merecimento relativo, que a representação dos eleitores portugueses no Parlamento Europeu se irá jogar.
A história não se repete. Como afirmava Karl Marx no "18 de Brumário de Luís Bonaparte", a história apenas se repete como farsa. Esta é uma verdade que se aplica a todos os "restauracionismos", mas também ao próprio Marx e a Adam Smith. O fundamentalismo da Escola de Chicago nada tem a ver com os filósofos liberais da Revolução das Luzes. A função social da "propriedade", para John Locke, na Inglaterra do século XVII, era condição de uma autonomia pessoal hoje irreconhecível na titularidade de "futuros" e "derivados" dos mercados financeiros internacionais. A relevância política e cultural do "mercado", outrora decisiva na emergência das instituições democráticas da Grécia antiga, não deixou rasto que se vislumbre na especulação bolsista e na economia de casino em que se tornou o capitalismo financeiro global. Não há receitas velhas para os problemas novos. Com o enfraquecimento dos estados e a subordinação da política à economia global, a degradação da democracia só pode ser compensada pela "conquista" de espaços mais amplos. É por isso que um novo fôlego na construção política europeia se tornou mais urgente do que nunca para suprir as insuficiências escandalosas da união monetária, para transformar o pacto de estabilidade orçamental num caminho para a união fiscal, para salvar a paz e a solidariedade entre os povos deste trágico continente confrontado com a ameaça crescente dos egoísmos nacionais.
Não há solução fora da Europa para os gravíssimos problemas que afetam este país desgraçado pela troika e pelas políticas do atual Governo, e que estão a minar a união dos povos europeus que acreditaram nas promessas de solidariedade que emergiram, convincentes, da devastação da Segunda Guerra Mundial e da queda do muro de Berlim. No plano doméstico, a farsa do "bom aluno" mil vezes repetida nos anos de ouro do cavaquismo não serve, como mais uma vez se demonstrou! É preciso que os deputados portugueses no Parlamento Europeu tenham voz própria, que sejam capazes de procurar cumplicidades, identificar interesses comuns, lançar pontes, construir alianças. Na Europa, há que derrotar os céticos e criar a força necessária para fazer avançar as indispensáveis reformas institucionais. Esta é hoje uma questão de sobrevivência da União Europeia. É isso que está em jogo nas eleições de 25 de maio.