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Acompanhei à distância o debate na generalidade do Orçamento para 2023. Julgo que o país também. Faltou-lhe aquela pimentinha dramática que Marcelo colocou na aprovação do documento, o ano passado, com o extraordinário resultado das eleições antecipadas. Mesmo após esta vergonha política e pessoal, o presidente não se privou de andar a murmurar pelos cantos as suas doutas "apreciações". Afinal, Medina não deixa de ser um neo-afilhado do homem depois da recandidatura presidencial. O PS absoluto e governativo conta muito com Marcelo, mesmo sabendo que Marcelo nem com ele próprio já conta. Do pior Parlamento dos últimos quase 50 anos, e com o pior Governo dos últimos sete, não podia esperar-se melhor. Nem em política, nem em urbanidade. De uma maneira geral, tivemos ministras e ministros sem rasgo, apenas a repetir uma velhíssima cartilha, torpe e desonesta, em que entra invariavelmente o Governo que antecedeu estes três. Só Medina pretendeu acrescentar um perfume distinto, como que para fazer de separador em relação ao passado próximo - que os socialistas querem esquecer - de aliança objectiva com a extrema-esquerda e o PC. Costa agarrou-se a um papel tribunício, a abarrotar de vulgaridade, como "dono" político da maioria. Logo, tanto do Governo como do Parlamento, distribuindo lérias e larachas à direita e à esquerda, algumas impróprias do cargo que ocupa. Para recorrer a termos do PC, noutros contextos, existe uma convergência objectiva de interesses entre Costa e Ventura na estúrdia vazia. Ao dirigir-se aos liberetas, ainda de Cotrim, como se dirigiu, Costa aproveitou e "puxou" pelo Chega, uma vez que há muito arrumou a histriónica Catarina no lugarzinho que o Bloco ocupa. Quanto ao mais, está fartinho de ser primeiro-ministro e, a cada gesto ou palavra, isso revela-se. Talvez esteja a preparar Medina para ser o seu Sunak, com tanto escândalo envolvendo governantes e "próximos". Por outro lado, fora da Assembleia, foi vê-lo a "avisar" o BCE por causa da inflação, uma ingratidão se pensarmos que, sem o BCE, Costa não tinha feito sequer um terço das flores que andou seis anos a fazer. Qualquer Orçamento entra em vigor desfasado da realidade momentânea. Este entrará particularmente, dado o ambiente interno e internacional, pelo que toda esta fantochada parlamentar e governativa é para esquecer. Lembro Eça em "Os Maias". "Todo o mundo concorda que o país é uma choldra. E resulta portanto este facto supracómico: um país governado "com imenso talento", que é de todos na Europa, segundo o consenso unânime, o mais estupidamente governado. Eu proponho isto, a ver: que, como os talentos sempre falham, se experimentem uma vez os imbecis." Eu também.
o autor escreve segundo a antiga ortografia
*Jurista