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A malta às vezes tem a mania de complicar o que é simples. Ainda outro dia, depois de aviarmos dois belos rodovalhos na Tasca da Linda, demos por nós (eu, a Ana Peixoto, a Ana Carla, a Ivete, o Luís, o Miro e o Rui) à conversa junto a uma placa da SMSBVC que advertia para a presença de um buraco. Acabaríamos todos por chegar lá, mas o Luís Oliveira (pudera, é o responsável pelo escritório do JN no Alto Minho!) logo descodificou a sigla da entidade misteriosa e amiga - Serviços Municipalizados de Saneamento Básico de Viana do Castelo - e tirou a moral da história: mais valia terem-na batizado Esgotos de Viana. Curto, simples e grosso é sempre melhor.
Nós, nos jornais, estamos carregados de culpa neste cartório. "Matam luso para roubar carro e TV". Luso? Só se for a água - mesmo assim prefiro a das Pedras. Conhecem alguém que diga: "Já sabias que o conjunto luso obteve o bronze no Mundial de Marcha?". Eu não e juro-vos que diria (e escreveria): "Ficamos em 3.0 no Mundial de Marcha" .
Luso (quatro batidas) em vez de português (nove batidas) é horrível, mas ainda tem a desculpa de dar jeito nos títulos, pois ocupa menos de metade do espaço. Mas fármacos? "Um quarto dos jovens toma fármacos para a concentração". Avisem-me se conhecerem alguém que lamenta ter-se esquecido de tomar o fármaco para a tensão ou diga que vai à farmácia comprar um fármaco para as dores de cabeça. E o espaço não serve de desculpa, pois apesar de medicamento ter 11 batidas, remédio tem as mesma sete que fármaco.
A insegurança das pessoas que se arvoram em donas do cânone do bom gosto no português escrito leva-as a ter medo das palavras e por isso estão sempre a tentar castrá-las, com o uso indevido de aspas, ou a aparar-lhe as unhas, persistindo em substituições ridículas, como a de preso (cinco batidas) por recluso (sete batidas) - "Olha, ó Soraia, sabias que o tio da Sandra do 7ºD está recluso em Custóias?" -, de morrer por falecer (será melhor falecer do que morrer?), de lixo por resíduos sólidos urbanos.
Este medo contagiou os padrinhos não só das empresas municipais (como a SMSBVC) mas também de empresas públicas como a EGF. A empresa que produz eletricidade chama-se Eletricidade de Portugal, a das águas é a Águas de Portugal, a das comunicações é a Portugal Telecom. Mas a que trata do lixo é a Empresa Geral do Fomento. Um engano, meninos! Devia chamar-se Lixos de Portugal. Empresa Geral do Fomento? Até parece que empresta dinheiro às PME, e não se dedica ao milagre da transformação em eletricidade, biogás e adubos de boa parte dos 450 kg de lixo que cada um de nós faz por ano.
Não deixa de ser curioso que tenhamos vergonha de chamar lixo às coisas malcheirosas e sujas que produzimos, mas não nos ensaiemos nada em dizer e escrever na primeira página que a Fitch atribui o rating de lixo à nossa dívida publica. Os psiquiatras e os especialistas em semiótica têm de certeza boas explicações para isto, mas eu sou apenas um simples que detesto quem está sempre a meter o complicador. E agora calo-me, pois o desafabo já vai longo e o melhor é fechar a loja.