Falta um desígnio para enfrentar as dificuldades
O Governo lançou uma série de iniciativas e medidas que revelam vontade política de resolver problemas sentidos há muito.
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Por exemplo, um pacote de medidas para enfrentar o problema da habitação que vão do estímulo e controlo do mercado de arrendamento à construção pública e municipal de novos fogos, passando pela intervenção em territórios críticos nas áreas metropolitanas. Ou, ainda, iniciativas para melhorar o acolhimento e a integração de imigrantes, através da sua regularização extraordinária e do reforço da fiscalização das condições de trabalho. Podíamos citar também medidas de regulação e de reorganização no setor da saúde, de reforço orçamental e investimento nos museus e património no setor da cultura, de apoio à modernização das empresas e à inovação no setor da economia, ou de avaliação e melhoria do modelo de financiamento e dos instrumentos de regulação na ciência e ensino superior.
Podemos não estar de acordo com tudo o que está a ser feito, mas temos de reconhecer que há iniciativa política e vontade de enfrentar problemas novos e antigos. Contudo, saltam à vista dois problemas. Em primeiro lugar, o debate público está dominado por uma visão pessimista e destrutiva que impede a valorização dos aspetos mais positivos das propostas do Governo. Em segundo lugar, no dia a dia, nas conversas em casa e no trabalho, o país parece atingido por um desânimo generalizado.
Muitas explicações para esse desânimo têm sido tentadas: problemas de comunicação política, falhas no desenho das medidas, deficiências na forma como são aplicadas. E algumas dificuldades residirão nestes planos. Considero, porém, que a causa principal para a falta de otimismo resulta das dificuldades económicas provocadas pela inflação e consequente compressão dos salários, bem como pela ausência de perspetivas de melhoria neste domínio crucial da vida das pessoas. Muitos portugueses estão a enfrentar sérias dificuldades económicas com a crescente perda do seu poder de compra. E parece faltar um propósito, um desígnio para enfrentar estas dificuldades. Desígnio como o que existiu no final do período da troika, com a saída limpa. Ou no pós-troika, com a reversão da perda de poder de compra e das medidas restritivas. Ou, na pandemia, com o objetivo de salvar vidas. Agora, parece faltar um fim à vista para as dificuldades de uma vida sem perspetivas.
As medidas e iniciativas do Governo são importantes, mas não se encontram nelas respostas para melhorar as condições materiais de vida das pessoas num prazo que sintam como razoável.
*Professora universitária