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Não há como fugir-lhe, seremos sempre o país dos três F. Ainda que as vogais e consoantes à frente do F possam mudar. Neste momento diria que somos a nação de Fátima, Futebol e... Festivais de verão. E mesmo Fátima só não está em perigo de ser substituída por Facebook porque o próprio Facebook já foi trocado pelo Instagram. Assim ficaria o país do I e dos dois F, o que não soa tão bem. Ficávamos "IFF", o que faria de nós, em inglês, o país do "se". Não deixa de ser verdade. É a velha história do "se cá nevasse fazia-se cá ski" (sempre quis citar os Salada de Frutas neste espaço de opinião). A verdade é que acaba sempre por não nevar e, mesmo que nevasse, não estaríamos prontos para o ski, como não estamos prontos para os incêndios que surgem sempre na mesma altura do ano. Teríamos de improvisar, fazendo uns skis artesanais que funcionariam tão bem como o SIRESP. Mas esqueçamos essa outra tradição estival que é deixar arder preciosos pedaços de terra e foquemo-nos na mais inofensiva: os festivais de verão. Podemos até não ter verão, pode haver chuva, granizo e, quem sabe, a tal neve que há tanto esperamos, para poder esquiar... mas teremos sempre festivais. Eles estão para os portugueses como Paris está para Rick e Ilsa, no Casablanca. Não deve haver, por esse Mundo fora, um país que tenha mais festivais de música per capita. Se começássemos a dar mais valor a esse índice do que ao PIB, abandonávamos logo a cauda da Europa. Aliás, faríamos esse percurso rumo ao topo às cavalitas de alguém, que é o meio de transporte mais usado em festivais. E felizmente só aí. O que seria os rapazes terem de alancar com as namoradas aos ombros nas filas da Loja do Cidadão... Com tanto evento, depois do velho "pobres mas honrados" poderíamos ser os "pobres mas divertidos". Croka"s Rock em Oliveira do Arda, Woodrock na Praia de Quiaios, Zigurfest em Lamego... os festivais de verão devem ser a única área em que conseguimos, efetivamente, descentralizar. Isto já para não falar do Bardoada e Ajcoi, no Pinhal Novo. Quis dar mais destaque a este porque acho que o nome merece! Temos muitas terras sem parque infantil, como acontecia outrora em Sobral de Monte Agraço, e ainda mais sem maternidades, mas certames e festivais não nos faltam! Há dias houve uma grávida do Algarve que teve de ir até Beja para dar à luz e daí foi enviada para Évora. É o chamado "vá para fora cá dentro" que deve ser especialmente enervante quando se pretende que uma criança que está dentro há nove meses vá para fora. Mais valia ter aguentado mais um mês e desfrutar dos festivais. Até porque agora já há alguns com zonas para grávidas! São verdadeiras cidades, faz lembrar os cruzeiros, mas com menos idosos. Será que já criaram áreas para idosos também? Se existir, é para lá que quero ir. Tenho tanta paciência para festivais como uma senhora de 90 anos. Acho que é poeira a mais, calor a mais quando se chega, frio a mais quando se vem embora, gente a mais, euforia a mais, filas a mais, para receber brindes a mais, que vão completar os "looks festivaleiros" que as pessoas pensam estar "demais" mas só nos levam a pensar "menos, por favor". E lá pelo meio há música, claro, mas muito longe... a não ser para quem foi para a porta do festival às 3 da tarde e correu para junto do palco, aguentando estoicamente e sentindo aquela adrenalina "será que é desta que fico aqui esmagado contra as grades, ou é só mais um dia em que passo 12 horas sem urinar?". Quem fica mais para trás, e vê os artistas, a verdadeira razão do festival existir, na linha do horizonte, como se fossem do tamanho de um Pollypocket, tem de se entreter com outros passatempos. O mais comum, e também o mais desafiante, é o "encontra um amigo também". Dos milhares de pessoas que encontramos no recinto, há pelo menos metade que passa a noite ao telemóvel a tentar localizar um amigo. "Estou atrás da Super Bock, à esquerda, de frente para o palco", grita o Raul. Não se ouve bem porque há uma banda qualquer a fazer barulho. De repente replicamos as conversas do verão de 93, junto à Bola da Nivea. Quando finalmente o encontramos, está a soar o último acorde da última música... e lembramo-nos que nem gostamos assim tanto do Raul. É um chato e vamos ter de esperar por um táxi durante 2 horas com ele...