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Nas últimas semanas, o JN publicou vários casos de pais que viram os filhos serem entregues compulsivamente para adoção. Todos eles estão unidos pela pobreza, todos eles recorreram aos tribunais para contestar a posição da Segurança Social. Armando Silva, Lígia Silva, Gabriel Ribeiro e Vera Nogueira lutam por um direito, o de poderem ser pais de quem geraram, com as escassas armas de quem sofre uma situação de grande fragilidade social.
Não é fácil vestirmos a pele de quem passa por estas situações, mas não podemos esquecer nunca que, por muito longe da nossa realidade que eles nos possam parecer, há algo em que são completamente iguais a nós: são cidadãos de corpo inteiro, detentores dos mesmos direitos e deveres.
Por essa razão, impõe-se perguntar e escrutinar se foram exploradas todas as possibilidades de apoio social para evitar a decisão extrema da adoção e se, para defesa do interesse das crianças, era mesmo necessário retirá-las da guarda dos pais.
Cada caso é um caso, mas é complicado responder afirmativamente quando temos a história de um pai a quem foi negada a oportunidade de simplesmente visitar a filha, mesmo depois de já ter emprego e casa (Armando Silva), ou quando se retiram dois filhos a um casal (Gabriel Ribeiro e Vera Nogueira) deixando outros dois à sua guarda.
O que se percebe em todos eles é a luta desigual contra a máquina intricada, demorada e complexa da Segurança Social e dos tribunais, o que se vê em todos eles é que sem a intervenção de advogados empenhados e, já agora, da Imprensa, estes cidadãos facilmente seriam triturados sem deixar rasto.
Em fevereiro de 2016, Portugal foi condenado no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem pelo caso de Liliana Melo, a quem foram devolvidos os seis filhos que lhe haviam sido retirados. Foi uma chamada de atenção de que, perante os casos que temos exposto, temos fundadas razões para acreditar que não foi ouvida. Mas é urgente - até porque em situações como estas o tempo é inimigo - começar a ouvir uma voz clarificadora do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, da sua Inspeção-Geral, do Observatório da Adoção e dos responsáveis políticos.
Não se queixem depois de que os cidadãos se sentem longe dos seus representantes quando os deixam órfãos de proteção como se fossem filhos de ninguém. É em questões como estas que se mede a qualidade de uma democracia, quando não se abandona no silêncio os seus mais frágeis cidadãos.
*SUBDIRETOR