O convite surgiu uns dias antes - Se topar [estiver de acordo], podemos almoçar no Martin Fierro, na Vila Madalena, às 12.30, e de lá vamos à Biblioteca Villa Lobos ou à Biblioteca de São Paulo. Topa?
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Ia encontrar o Pierre André Ruprecht, o presidente da SP Leituras, que sabe tudo sobre bibliotecas e sente uma alegria contagiante quando junta pessoas de díspares estratos sociais à volta das mesmas coisas; sejam essas edifícios improvisados, torres inúteis mas bonitas, ou simplesmente ideias.
O Brasil é grande demais para que possas dizer que já lá foste. Carlos Drummond de Andrade no poema "Hino nacional", do livro Brejos das Almas - escrito em 1934, no rescaldo da Guerra Paulista - escreve que "Nenhum Brasil existe"; e tem razão! Muitos Brasis existem e por isso ele sempre te surpreende.
Mas é este Brasil paulistano que me encanta mais e é nele que me sinto em casa. Aqui é onde melhor consigo achar gente maravilhosa, "dando sopa" no sopé dos prédios, no acarajé das gráficas, nas peles morenas, nas cozinhas argentinas e no olhar desassombrado de quem sabe que a única coisa que interessa é o tempo.
Uma hora - bem gasta - em São Paulo equivale a uma semana de Nova Iorque e a um mês inteiro em Lisboa.
Volto a Drummond de Andrade e lembro-me como ele acrescenta inquietação ao poema Hino - "Acaso existirão os brasileiros?"
A resposta chegou-me, clara, como se a luz do Rio se refletisse no rosto iluminado do meu anfitrião quase suíço que cita em francês filósofos alemães e tem por paixão mudar o Mundo.
Nesse momento em que cheguei, como por instinto divino, ele voltou-se e viu-me. Acenou-me olá, e o universo reconstruiu-se de novo com ideal e esperança, e o Pierre André sorriu.
*Presidente da Associação Portugal Brasil 200 anos
