Ouvidos todos os confrontos, entrevistas e os três discursos de vitória, uma semana depois das directas do PSD não fica uma única ideia que sirva de rumo a uma alternativa ao Executivo socialista. Nada fez ressonância na realidade das dificuldades do nosso quotidiano e nada foi dito que faça acreditar que amanhã será melhor.
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Depois desta sombria campanha, aos descontentes mais vale votar para lá da Esquerda e para lá da Direita, num ensaio de lucidez saramaguiano que, pelo menos, manda uma mensagem clara de insatisfação, já que nas avenidas habituais de escolha política não parece haver alternativas viáveis. Os três candidatos dividiram entre si os resultados do desalento das bases e clientelas que fizeram as derradeiras apostas numa corrida de cavalos desorientados, intelectualmente subnutridos e ideologicamente vazios.
Foi isto que se viu de fora. Defensores entusiasmados e optimistas aplaudiram Manuela Ferreira Leite por ter provado que era possível ganhar uma eleição sem se comprometer com nada. Nem promessas nem estratégias. Que mau sinal para um projecto político. A antiga ministra das Finanças e da Educação murmurou entre silêncios coisas abstractas sobre pobres, exibindo uma insuspeitada agenda humanística e mantendo hasteado em surdina, como seu grande trunfo, um silencioso entendimento com o prof. Cavaco Silva.
Um mérito para uns, para outros uma ameaça. Passos Coelho abriu um rol de neoliberalismos onde se aliviavam cargas fiscais por todo o lado e não se conseguia entender onde é que se ia buscar financiamento para os serviços mínimos do Estado. Santana Lopes sustentou a sua campanha com os sucessos do Túnel do Marquês, da descontaminação de Monsanto, com a lamúria de que Sampaio é mau e que ele se tinha emendado. No conjunto, os três empenharam-se em defesas exclusivamente clubísticas, mostrando uma confrangedora ausência de capacidade de marcar diferenças entre a social-democracia do PS e a do PSD.
Agitaram-se bandeiras do passado de glórias e reclamaram-se sucessões directas de Sá Carneiro, protestaram-se seriedades imaculadas, energias inesgotáveis e experiências governativas sólidas, mas não foi dito nada que conseguisse fazer ver se haveria país para além de Sócrates. Os três candidatos vieram dizer-nos que os dias felizes estavam aqui outra vez, não no presente nem no futuro, mas nos passados em que tinham participado, esquecendo-se das inflações galopantes, taxas de juro de dois dígitos e programas de emergência do FMI, que fazem os actuais critérios de convergência do Euro parecer tempo de vacas gordas.
O que apareceu foi um PSD tripartido entre uma ausência de projecto, uma inconsistência de projecto e uma incoerência de projecto. Manuela Ferreira Leite tem um ano para preencher este triplo vácuo. Até agora, não transmitiu nenhuma mensagem que fizesse mudar a atitude nacional que ela própria tão bem diagnosticou na campanha: que o PSD chegou àquela terrível fase em que pode falar muito que ninguém o ouve. Talvez porque não diz nada há imenso tempo.