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A 7 de Setembro passado, o país entrou em sobressalto com o anúncio alarmante de uma fuga de cinco reclusos, altamente perigosos, do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus. Todos os média replicaram a notícia e os canais de TV organizaram painéis para discutir o assunto. O que mais me surpreendeu nas intervenções foram as afirmações de alguns dos comentadores, culpando, de imediato, as mais diversas autoridades, individuais, e, até, a lei que juntou as direcções-gerais da Reinserção Social e dos Serviços Prisionais numa só. Sem que tivessem sido divulgados dados precisos sobre as circunstâncias e modo da fuga, já o director-geral dos Serviços Prisionais, o director-interino do Estabelecimento Prisional em causa e a falta de chefia dos guardas foram declarados os responsáveis. Porém, o caso não é único... Recordo a fuga desta prisão, em 1975, de dezenas de agentes da PIDE-DGS; em 1978, nova fuga, do mesmo estabelecimento, de cerca de metade dos seus reclusos; em data que já não consigo precisar, ocorreu uma tirada de presos de uma carrinha celular, que se dirigia para a prisão de Caxias; em 1985, 13 elementos das FP25, presos preventivamente pelo crime de organização terrorista, evadiram-se do Estabelecimento Prisional de Lisboa. Estes exemplos parecem-me suficientes para concluir por falhas graves de segurança nas cadeias do país. Não obstante as evasões que se têm repetido, não houve sério investimento numa reforma profunda do sistema prisional. A segurança é tratada com displicência, e até alguma negligência, mas não ficam por aqui as falhas deste sistema. Não em termos de legislação, que segue as mais modernas orientações do direito comparado, mas sim na vivência diária da população de cada prisão. Nunca houve empenho e vontade política para uma profunda reorganização do sistema e renovação dos edifícios prisionais. É toda uma vivência, por vezes confrangedora, a que estão sujeitos os reclusos e os guardas prisionais. Paradoxalmente, são permitidas benesses improváveis aos reclusos e, por outro lado, é-lhes negado, as mais das vezes, o respeito pela sua dignidade humana. Aos guardas não é reconhecida e respeitada a sua carreira, o permanente alto risco em que trabalham, mal dormidos pelas horas extra que têm de realizar por falta de pessoal. Por outro lado, os reclusos são amontoados em celas superlotadas, o trabalho que cada um realiza não é devidamente compensado, não há uma verdadeira organização naqueles estabelecimentos. Os edifícios são antigos, sem condições de habitabilidade e de respeito pela condição humana, quer dos detidos, quer dos guardas e demais pessoal trabalhador. A sra. ministra anunciou uma auditoria a todas as prisões do país sobre falhas de segurança, mas, em meu entender, ela deverá ser mais abrangente e tratar, também, do levantamento de todas as graves deficiências, quer humanas, quer logísticas, que se sabe existirem e se perpetuam numa área tão sensível da vida em sociedade.
*A autora escreve segundo a antiga ortografia