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Os cidadãos questionam-se sobre a relevância noticiosa da cirúrgica fuga para a Imprensa de elementos de prova constantes do processo Tutti Frutti. Com razão, considerando que no turbilhão de informações sobre propagados factos que ultimamente têm vindo a lume, imputando-se-lhes perturbação no funcionamento das instituições, toma-se conhecimento da girândola final, que arrasta de novo a Justiça para o seu descrédito e objecto de desconfiança por parte da população. Mais uma vez se recorre a extractos de conversas telefónicas, retiradas do seu contexto e atribuindo-se-lhes um conteúdo ilegal. O processo-crime foi instaurado há uns anos e aquelas terão ocorrido em 2017. Que interesses satisfaz e quem beneficia desta violação do segredo de justiça? Desde logo atribuíram aquela fuga ao MP. Esta afirmação é grave e difamatória. Como o podem dar por certo? Neste período de tempo o processo terá sido manuseado pela polícia investigadora, pelo MP, pelo juiz de instrução e por funcionários judiciais. Toda a matéria deve ser objecto de inquérito no qual se terá de investigar não só a responsabilidade ética e criminal dos autores da violação do segredo, como a difamação do bom nome e credibilidade do MP. É fundamental para o prestígio da Justiça que se proceda urgentemente ao apuramento da autoria dos crimes referidos de modo a prevenir, de uma vez por todas, a constante violação da lei. Terá de se saber em que ponto se encontra a investigação, a cargo de que autoridade tem estado e razões do longo período de tempo decorrido desde a instauração do processo até agora. De recordar que a CRP acolhe o segredo de justiça, cuja violação é crime, de acordo com o CP, que diz quem... ilegitimamente der conhecimento... do teor de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça... é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias... Reforçando, na vertente da protecção do cidadão investigado, durante o inquérito em segredo de justiça, a CRP consagra o reconhecimento do direito ao bom nome, reputação e imagem... No caso concreto, nenhum dos políticos identificados na notícia foi ouvido como suspeito, arguido, testemunha ou declarante. Que notícia é esta? Para que serve? Durante muito tempo foi discutido o problema da violação sistemática do segredo de justiça. Porém, não houve qualquer alteração. Há uma evidência sobre a qual o poder legislativo tem de se debruçar: a moldura penal aplicável ao autor deste crime não é susceptível de prevenir, intimidar ou impedir a prática do ilícito. Perante um objectivo definido, passar a informação à Imprensa e o furo jornalístico da sua divulgação pública, a pena aplicável não retrai os eventuais infractores. É preocupante a violação do segredo de justiça pelas consequências negativas que acarreta para a investigação e para o princípio da inocência do arguido até decisão transitada, pelo que, haverá que tratar a questão sopesando os bens jurídicos postos em causa.
*Ex-diretora do DCIAP
A autora escreve segundo a antiga ortografia