A mensagem que o Papa Francisco escreveu para o 55.º Dia Mundial das Comunicações Sociais, que se assinala no domingo, não poderia ser mais atual: exorta os profissionais da comunicação a ir aonde ninguém mais vai, a iluminar periferias que permanecem na sombra, a falar com as pessoas e a escutá-las com atenção. Porque contar a verdade é uma tarefa que se faz através de múltiplos ângulos.
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O desafio que o Papa lança de sair à rua e "gastar a sola dos sapatos" não é fácil. Não porque os jornalistas não gostem do terreno. Gostam muito. Mas a atual crise financeira que asfixia os grupos mediáticos limita essa possibilidade. Por isso, as agendas noticiosas são cada vez mais monotemáticas e fazem-se à volta de uma confraria das fontes que habita os corredores do poder e dispõe de eficazes assessorias de comunicação que vão garantindo certas tematizações. Isso não é um problema apenas das redações. É da sociedade, porque afeta profundamente a qualidade das democracias. A atual crise pandémica acentuou mais estes constrangimentos que se acumulam a partir da falta de receitas, não tendo havido particular cuidado em dotar o setor dos apoios necessários para evitar a morte de alguns projetos editoriais.
Nesta mensagem, o Papa fala também na necessidade de "encontrar pessoas para procurar histórias ou verificar com os próprios olhos determinadas situações". Regressar a este face-a-face numa altura em que normalizamos conversas através de plataformas digitais é uma proposta contracorrente. Que deveria acolher uma profunda reflexão não só dos jornalistas, mas de cada um de nós, que tanto temos acelerado nas conversas virtuais. O Papa vem falar-nos dos encontros olhos-nos-olhos. Com tempo. Porque há uma componente sensorial nesse tipo de interações que nenhuma comunicação à distância consegue construir. É preciso, pois, voltar ao básico que ganha, neste contexto, uma natureza fundadora.
Destacam-se também as oportunidades e insídias do universo digital, sobretudo das redes sociais. A aí lembra-se que todos somos responsáveis pelos conteúdos que difundimos e consumimos. Numa altura em que muitos colocam o privado, por vezes até o íntimo, em público, nunca é demais travar um frenético caudal de publicações, feito muitas vezes de obscenidades, mentiras ou manipulações...
Não é uma mensagem extensa, esta que o Papa nos dirige. Mas é colossal no sentido que pretende alcançar. Encontrar as pessoas onde estão e como são e, com isso, construir uma comunicação relevante é, na verdade, um enorme desafio.
Professora associada com agregação da Universidade do Minho