<p>Após o acordo entre PSD e PS para regular uma revisão do Plano de Estabilidade e Crescimento visando tranquilizar os mercados e salvar o país da bancarrota, já muita água passou debaixo das pontes. Demasiada e poluída. O Governo meteu e continua a meter os pés pelas mãos no que diz respeito à concretização do que foi acordado em termos de política fiscal, é equívoco e contraditório relativamente à exigência social-democrata de suspender os grandes investimentos públicos, confronta-se com a desconfiança da generalidade dos Portugueses quanto à sua capacidade de liderança perante tal descalabro e, principalmente, continua a fazer da arrogância autista e mal-educada o quotidiano do seu comportamento.</p>
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Como reacção ao sentido de Estado do PSD comporta-se como o pobre mal agradecido. Dos dilates avulso de um aparelho irresponsável, aos insultos gratuitos a Passos Coelho vindos do vice-presidente do grupo parlamentar socialista, Sérgio Sousa Pinto, do "tango" de José Sócrates, à arruaça do incorrigível ministro da Defesa, já tivemos desaforo e insensatez para todos os gostos.
Mas é a intervenção de ontem do ministro de Estado e da Defesa Nacional que pode e deve fazer repensar o PSD. É inaceitável, e a primeira vez em 35 anos, que um ministro das Forças Armadas se envolve no mais comum debate político e partidário. A acusação de que o PSD é um partido oportunista deve obrigar-nos a reflectir sobre o sacrifício que estamos a corporizar.
A postura de responsabilidade do PSD só será consequente se o Governo, finalmente, começar a governar. Isso pressupõe desenvolver as medidas anunciadas, mas também o desenvolvimento de outras, de cariz verdadeiramente reformista, que nunca serão viáveis sem o apoio do PSD.
Será esse entendimento possível face a este crescendo de auto-suficiência? E este comportamento absurdo não tende a exacerbar-se logo após José Sócrates ver ultrapassada a data a partir da qual já não será possível dissolver o Parlamento e convocar eleições antecipadas?
Certeza, só existe uma. Este cenário de meias tintas interessa ao executivo socialista, que com ele pode ter um salvo-conduto para, mesmo com o país esboroar-se, se aguentar no poder pelo menos até ao Verão de 2011. Interessa ao Presidente da República, que não quer confusões que coloquem em causa o seu projecto unipessoal. Interessa, eventualmente, a uma oposição interna, por agora adormecida, mas que nunca aceitou a vitória do PSD popular e basista.
Dúvidas, face ao cenário presente, somam-se algumas. A ajuda, desnecessária, a uma vitória inevitável de Cavaco Silva justifica mais este sacrifício do PSD? A oportunidade dada ao Governo não poderá conduzir a uma herança ainda mais catastrófica daqui a um ano? Este compasso de espera responsável não poderá abrir espaço a intervenções inconsequentes, mas agitadoras e desestabilizantes, por parte de muitos protagonistas afastados da primeira linha da liderança social-democrata (atente-se à declarações de ontem de Santana Lopes, que apontaram António Mexia como candidato a primeiro- ministro!)?
Passos Coelho tem uma quinzena de dias para tomar decisões definitivas. Terá o meu apoio seja qual for a sua decisão. Todavia, acho que não deve ser condicionado, nem pelo projecto presidencial, nem pelo receio de assumir responsabilidades num momento muito difícil. Deve decidir em seu juízo, mas tendo em conta unicamente a sua percepção do interesse nacional.