Aforma escolhida por Fernando Seara para confirmar a sua candidatura à presidência da Câmara Municipal de Lisboa foi uma grande jogada política. Simplesmente porque o atual autarca de Sintra escolheu como ponto de partida a situação de único visado. E todos sabemos que os eleitores não costumam premiar quem ataca em matilha.
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Ao sublinhar que se fosse candidato em qualquer outra autarquia do país não estaria impedido quanto está em Lisboa - único concelho em que um tribunal de recurso validou uma decisão de primeira instância -, Seara definiu-se como candidato a abater. Mais: fê-lo com a margem de tempo e de risco jurídico bem calculada e por forma a que a sua campanha eleitoral possa ser reforçada na etapa final caso o Tribunal Constitucional valide a tese de que o impedimento de alguém se candidatar após três mandatos é territorial e não universal.
O tempo, esse, irá muito provavelmente até finais de agosto. O intervalo suficiente para, em discurso direto ou através de mensageiros, Seara poder consolidar na opinião pública a ideia de que há contra si uma coligação negativa de interesses e que essa coligação é particularmente feroz uma vez que chegou que nem leite a ferver a uma dupla decisão da justiça contra si.
Quanto ao risco calculado, esse resulta do seu próprio conhecimento do sistema de justiça e sobretudo de qual é a doutrina que tem dominado as decisões do Tribunal Constitucional em matéria de direitos e deveres dos cidadãos.
Sim, porque por mais voltas que se possam dar - e elas são muitas, variadas e algumas delas indecentes do ponto de vista da ética do combate político -, a decisão final do Tribunal Constitucional dificilmente deixará de colocar nos pratos da balança da justiça o peso da perda, mesmo que limitada, do exercício de um direito essencial: o de eleger e ser eleito.
Resumidamente, do que podemos compilar de decisões do Tribunal Constitucional nesta matéria, é possível afirmar que o seu património jurisprudencial é avesso a interpretações que possam, por elas, contribuir para estender limitações a esse direito essencial de cidadania.
Ora é disto mesmo que se trata quando estão formadas duas fações: uma e outra referindo-se não exatamente à lei mas ao seu espírito. Isto para não falar da adulteração de redação da dita cuja, para a qual o próprio presidente da República chamou à atenção e a qual, pasme--se!, é grotesca, porque o que foi escrito não foi exatamente o que foi decidido pelos deputados.
Por fim: a democracia precisa de elites e mais ainda que seja o povo a escolher por qual delas quer ser governado. E isto deveria valer da Junta de Freguesia à Presidência da República. Pelos anos que o povo achasse confiar. E se houvesse que limitar, que fosse igual para todos.